A ética do sucesso

   Por: João Batista Libânio
O sucesso tornou-se imposição cultural. O fracasso se execra. Ao êxito se associam a euforia, a alegria, a felicidade. Ao insucesso, a depressão, o abatimento, a tristeza. Então se levanta no horizonte a luz fulgurante do triunfo a atrair-nos todo o tempo. Ela ilumina-nos o cotidiano de modo que não permanece nenhum rincão escuro sem que não seja penetrado por ela.

Ao exercer tanto fascínio sobre nós, esquecemos facilmente qualquer outra circunstância que envolva a vontade de sair-nos bem. No cotidiano acontece que não raro o nosso êxito se constrói à custa do fracasso de outro ou, pelo menos, em cima dele. As vitórias trazem a sequela da derrota do adversário. As manchetes vivem a contrapor tal jogo. Que digam os atleticanos e cruzeirenses.

As crianças, bem pequeninas, experimentam já a disputa em busca do sucesso, desde a frequência de melhor escola até nas avaliações escolares. Tudo se mede a partir da escala de rendimento. À medida que se cresce e se entra na selva de competições, a força do êxito se faz maior. Não há limite para tal campo: vida profissional, vida afetiva, vida social, vida familiar. Tudo se mede pela hierarquia milimétrica das vitórias, dos triunfos.

Sob o olhar da ética, o quadro se modifica. Em vez do próprio sucesso, surge outra pergunta: para que e para quem ele traz vantagens ou desvantagens? E, a partir daí, se julga o valor de tal desejo e realização. Existem triunfos que nos conduzem à arrogância, a julgar-nos superiores aos outros e assim a agir. Nada nos faz romper a barreira ética da igualdade fundamental de todos os seres humanos a ponto de considerarmos outros inferiores. Além do mais, há mistério nas pessoas que não nos permite entendê-las totalmente, mesmo quando lhes detectamos comportamentos repreensíveis. Elas são mais que os próprios atos. Ninguém se identifica totalmente com determinado agir, nem para bem, nem para mal.


BEM E MAL

Atravessa todas as ações humanas certa ambiguidade no jogo de bem e mal. Naturalmente, não na mesma medida, mas o suficiente para tirarmos da ocular o juízo peremptório sobre nós mesmos e sobre os outros. A ética aproxima-nos do respeito à diversidade, aos problemas alheios que talvez lhes tenham provocado insucessos. E, mesmo os próprios triunfos se devem a tantas outras pessoas, circunstâncias independentes de nós e a dons recebidos. Atribuí-los ao esforço e ao mérito pessoal soa, não raro, pretensioso.

A ética conduz-nos mais longe. Desperta-nos o sentimento de cuidado precisamente para aqueles aos quais a realidade tem reservado dificuldades, momento difíceis e de malogros. Em vez de compararmo-nos com eles em tom de superioridade, conduz a atitude oposta de compreensão, ajuda e presença.
O sucesso não merece ser considerado o valor decisivo da existência. Conta muito mais a proximidade com os desventurados a fim de animá-los em face do que lhes acontece. Abre-se-lhes então espaço de esperança e confiança não só em si, mas no valor transcendente que os habita. E a fé cristã traz acréscimo à ética ao sinalizar que no fracassado da cruz Deus realizou a maior vitória para a humanidade: sua salvação e essa terminou na vida pela ressurreição.

Artigo publicado no site Tribuna da Internet

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