Por: José Wilson Granjeiro
Decisão do Supremo abre caminho para
que candidatos aprovados peçam indenização por danos morais pela demora na
nomeação, diz colunista
Amigos, recentemente o mundo dos
concursos obteve mais uma importante vitória na Justiça brasileira. O Supremo
Tribunal Federal (STF) reconheceu a existência de Repercussão Geral do tema
tratado no Recurso Extraordinário (RE) 724.347. No processo, discute-se se
candidatos aprovados em concurso público têm direito a indenização por danos
materiais em face da demora na nomeação, efetivada apenas depois do trânsito em
julgado de decisão judicial que tenha reconhecido o direito à investidura no
cargo. No recurso, a União questiona se, em situações como essa, o Estado pode
ser responsabilizado civilmente.
O julgamento ocorreu em meados
deste mês, e o assunto mereceu amplo espaço na imprensa, com toda a razão. Eu
não poderia deixar de tratar do tema nesta coluna, diante da importância dele,
ainda maior porque a decisão da Corte será fundamental para o julgamento de
casos semelhantes no futuro. Sem dúvida alguma, muitos candidatos aprovados em
seleções diversas por todo o país enfrentam constrangimento semelhante ao da
parte envolvida no recurso extraordinário julgado pelo STF. Agora, todos eles
poderão recorrer à Justiça para se ressarcir dos prejuízos morais e materiais
causados por injustificada demora em sua nomeação e posse no cargo para o qual
foram aprovados.
Mas o que é a Repercussão Geral
de uma decisão do STF, e por que o reconhecimento dela nesse processo me deixa
tão satisfeito? Explico: Repercussão Geral é um instrumento processual inserido
na Constituição Federal de 1988 por meio da Emenda Constitucional nº 45,
conhecida como a “Reforma do Judiciário”. O objetivo da ferramenta é permitir
que o Supremo Tribunal Federal selecione os recursos extraordinários que vai
analisar, de acordo com critérios de relevância jurídica, política, social ou
econômica. A aplicação desse “filtro recursal” resulta em diminuição do número
de processos em trâmite na Suprema Corte e evita o notório crescimento do
volume de feitos a ela encaminhados nos últimos tempos.
Uma vez constatada a existência
de Repercussão Geral de um dado tema, o STF analisa o mérito da questão. A
decisão proveniente dessa análise é posteriormente aplicada pelas instâncias
inferiores, em casos idênticos, obrigatoriamente. A preliminar de Repercussão
Geral é analisada pelo Plenário do STF, por meio de sistema informatizado, com
votação eletrônica, ou seja, sem necessidade de reunião física dos membros do
Tribunal. Trata-se do chamado Plenário Virtual.
Foi o Plenário Virtual que
examinou o RE 724.347, originário da Justiça Federal de Brasília. Para recusar
a análise de um recurso extraordinário, são necessários votos de pelo menos
oito dos 11 ministros do STF. Se o número não for alcançado, o tema deve ser
julgado pela Corte, não mais virtualmente, mas em sessão normal do Plenário.
Após o relator do recurso lançar no sistema sua manifestação sobre a relevância
do tema, os demais ministros têm 20 dias para votar.
As abstenções nessa votação são
consideradas favoráveis ao reconhecimento de Repercussão Geral na matéria. E aí
está uma curiosidade do julgamento: logo no início dele, foi suscitada
preliminar sobre a constitucionalidade do tema. O Tribunal, por maioria,
reputou a questão constitucional. Foi voto vencido o ministro Luiz Fux, e não
se manifestaram os ministros Celso de Mello, Gilmar Mendes, Joaquim Barbosa,
Cármen Lúcia, Rosa Weber e Roberto Barroso. Ou seja, estes seis foram
considerados votos favoráveis à matéria. Já a decisão sobre a Repercussão Geral
do julgamento foi tomada por unanimidade pelo Plenário Virtual.
Reconhecida a Repercussão Geral
do tema, agora os ministros da Suprema Corte partem para a análise do direito à
indenização por demora na nomeação. Enquanto a matéria não é examinada, os
recursos com o mesmo tema ficam sobrestados (suspensos), até ser explicitado o
entendimento do STF. Se houver decisão sobre eles no mesmo sentido do STF, os
recursos estão prejudicados; se houver decisão em sentido contrário, será
realizado juízo de retratação.
Agora que já estamos bem
esclarecidos sobre a Repercussão Geral desse julgamento, vamos ao caso, que,
como eu disse, teve origem em recurso extraordinário levado ao Supremo após
julgamento no TRF 1 – Tribunal Regional Federal da 1ª Região –, que tem
jurisdição em Brasília, onde está sediado, em Goiás e em Tocantins. No recurso,
a União questiona se, em situações em que há demora na nomeação de candidato
aprovado em concurso público, o Estado pode ser responsabilizado civilmente.
O recurso extraordinário foi
interposto ao Supremo pela Advocacia-Geral da União, após acórdão do TRF-1 ter
reconhecido o direito de candidatos aprovados em concurso público a indenização
por danos materiais, em decorrência da demora na nomeação determinada
judicialmente. Para o TRF-1, a indenização deveria equivaler aos valores das
remunerações correspondentes aos cargos em questão, no período compreendido
entre a data em que os interessados deveriam ter sido nomeados e a posse
efetiva, descontados rendimentos eventualmente recebidos, durante esse período,
em razão do exercício de outro cargo público inacumulável ou de atividade privada.
No recurso extraordinário
apresentado ao STF, a União sustenta que é imprescindível o efetivo exercício
do cargo para que um candidato tenha direito a receber a retribuição
pecuniária. De outra forma, segundo alega a União, haveria enriquecimento sem
causa.
Para o relator do caso, ministro
Marco Aurélio, a situação jurídica discutida no processo pode repercutir em
inúmeros casos. No entender do magistrado, é preciso definir, sob o ângulo
constitucional, o direito à nomeação, uma vez aprovado o candidato em concurso
público, e as consequências da demora diante de um ato judicial que reconhece o
direito à investidura.
É importante ressaltar que
decisões anteriores do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do próprio Supremo
já reconheceram o direito à nomeação de candidatos aprovados dentro do número
de vagas estipulado pelo edital do concurso. Assim, tudo leva a crer que a
decisão final do STF nesse processo seja na mesma linha. Em outras palavras, é
provável que a União seja condenada a indenizar candidatos prejudicados pela
demora na nomeação para o cargo em que obtiveram aprovação. Como bem disse o
ministro Marco Aurélio, a decisão final do Supremo balizará inúmeros casos pela
via da Repercussão Geral e servirá também para definir, com base na
interpretação da Constituição, o direito de candidato aprovado em concurso
público ser nomeado e assumir o cargo sem protelações.
Essa é a decisão que todos nós esperamos venha a
ser adotada pelos ministros do STF no julgamento do mérito do RE 724.347. É a
nossa expectativa para que se faça justiça, de modo que os candidatos
prejudicados por injustificável demora em sua nomeação possam, finalmente,
assumir o seu feliz cargo novo!
Por: José Wilson Granjeiro, SOS
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