Semana
passada, o povo brasileiro sofreu mais uma derrota na Câmara dos Deputados.
Pode-se dizer que, de maneira sorrateira, os ruralistas — usando de
criatividade e em parceria com outros setores do parlamento e do governo
federal — facilitaram mais um avanço ao uso de insumos químicos (venenos) no
Brasil. Por: Dr. Rosinha
Quem
saiu vitorioso foi o agronegócio e a estreita relação com as empresas
multinacionais (financiadoras de campanhas), que movimentam bilhões de reais
por ano e que dão ao nosso país o imperioso título de maior consumidor de
agrotóxicos do planeta.
Cansados,
como eles afirmam, de se submeter aos procedimentos adotados pela ANVISA, IBAMA
e Ministério da Agricultura (MAPA), que regulam e normatizam a produção, uso,
comercialização e importação de agrotóxicos no Brasil, passaram a construir uma
nova estratégia.
Na
noite, quase sempre à noite, do dia 25 de setembro de 2013 foi votada e
aprovada a Lei de Conversão (nº25/2013) da Medida Provisória 619/2013, que vai
agora para o Senado Federal. No projeto, foram introduzidos três artigos, os de
nº 52, 53 e 54, que tratam de agrotóxicos.
O que
chama a atenção é o disposto no artigo nº 53, que dá a Instância Central e
Superior do Sistema Unificado de Atenção à Sanidade Agropecuária — SUASA, a
autorização de anuir com a importação, produção, distribuição, comercialização
e uso de agrotóxicos, e, aqui está o pulo do gato, concede ao Ministro da
Agricultura (MAPA) o poder de regular essas medidas.
A
redação dada ao artigo nº 53 permitirá que ato do Ministro da Agricultura
flexibilize as regras atuais e mesmo que em “caráter extraordinário e quando
declarado estado de emergência fitossanitário e zoossanitário”,
sob critérios ainda não revelados, poderá determinar que agrotóxicos sejam
autorizados em situações que podem atender ao interesse público.
Ou seja,
dá poder ao Ministério da Agricultura, dominado pelos ruralistas, e subjuga os
outros dois órgãos (ANVISA e IBAMA) para decidir o que bem entender quanto ao
uso de venenos (agrotóxicos) na agricultura.
Abaixo,
apresento o artigo nº53 na sua integra e indexo alguns comentários para
elucidar o que descrevi.
1.
Define o artigo 53, que “fica a instância central e superior
do Sistema Unificado de Atenção Agropecuária de que trata o § 4º do art. 28-A
da Lei nº 8.171, de 17 de janeiro de 1991, autorizada, nos termos do
regulamento, em caráter extraordinário, a anuir com a importação e a conceder
autorização emergencial temporária de produção, comercialização e uso quando
declarado estado de emergência fitossanitária ou zoossanitária (negrito meu) de:” em seguida vêm os itens.
O
Decreto nº 5.741/2006 que regulamenta os artigos de Lei 8.171, de 17 de janeiro
de 1991, define que a instância máxima central é o MAPA. Como pode se observar
no artigo 53, o Projeto de Lei de Conversão nº25/2013 flexibiliza não apenas os
agrotóxicos para as lavouras, mas também para o uso nos rebanhos da pecuária
(zoossanitário).
2. O §
1º do artigo 53 reza que “a concessão da anuência e da
autorização emergencial temporária deverá aplicar-se somente aos produtos
previstos nos incisos do caput estritamente necessários ao atendimento do
estado de emergência sanitária e fitossanitária oficialmente declarado devendo
ser especificado quanto: I – aos produtos e suas condições de uso; II – a
delimitação geográfica; e III – ao prazo de vigência”.
O
Projeto de Lei de Conversão nº25/2013 dá enorme liberdade ao MAPA, pois não
define o que é temporária. Seria o período da safra? Quanto tempo perduraria a
autorização dada para o uso destes agrotóxicos? Também chamo a atenção que os
critérios para ser decretada a emergência não estão definidos. Será que quem
mandará nestas definições serão os fabricantes de venenos?
3. O §
2º diz que “a autorização emergencial de que
trata o caput somente poderá ser concedida para produtos cujo emprego
seja autorizado em países com práticas regulatórias reconhecidas, na forma do
regulamento.”
Presumo
daí que não é necessário que o produto “importado” tenha sido testado e
avaliado no Brasil. As empresas multinacionais de agrotóxicos devem estar
muitos satisfeitas com essa iniciativa, pois é o que sempre pediram.
4. O §
3º estabelece que “a importação, produção,
comercialização e o uso de agrotóxicos, seus componentes e afins, ao amparo da
autorização emergencial temporária, prescindem do registro de que trata o art.
3º da Lei nº 7.802, de 11 de julho de 1989”.
Esse
parágrafo acaba com a necessidade de registro dos agrotóxicos no Brasil.
Eliminam-se as diretrizes e exigências dos órgãos federais responsáveis pelos
setores da saúde, do meio ambiente e da agricultura.
5. O §
4º define que “a anuência e a autorização
emergencial temporária de que trata o caput não poderão ser concedidas a
produtos agrotóxicos e afins que causem graves danos ao meio ambiente ou que
reconhecidamente: I – não disponham, no Brasil, de métodos para desativação de
seus componentes, de modo a impedir que os seus resíduos remanescentes
provoquem riscos ao meio ambiente e à saúde pública; II – não tenham antídoto
ou tratamento eficaz no Brasil; III – revelem características teratogênicas,
carcinogênicas ou mutagênicas, de acordo com os resultados atualizados de
experiências da comunidade científica; IV – provoquem distúrbios hormonais,
danos ao aparelho reprodutor, de acordo com procedimentos e experiências
atualizados na comunidade científica; e V – revelem-se mais perigosos para o
homem do que os testes de laboratório com animais tenham podido demonstrar,
segundo critérios técnicos e científicos atualizados”
Alguém
conhece algum agrotóxico que não cause danos ao meio ambiente?
O que se
espera, primeiro: que o disposto nesses artigos seja retirado pelos senadores;
segundo, caso isso não ocorra, que a presidenta Dilma vete-os em defesa do meio
ambiente, da razoabilidade, com prudência na autorização de agrotóxicos e pela
preocupação com a saúde humana.
Por: Dr.
Rosinha, médico pediatra, é deputado federal (PT-PR) e presidente da Comissão
de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados. No twitter: @DrRosinha.
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