Feminismo: a culpa é dos homens

O feminismo surgiu para combater a opressão que os homens exerciam sobre as mulheres e, portanto, fazê-las lutar pelo reconhecimento de sua dignidade. Provavelmente essa será a resposta-padrão que a imensa maioria de feministas, tanto homens quanto mulheres, fornecerá ante a indagação sobre o que vem a ser feminismo. Os homens, então, são os culpados pelo surgimento do feminismo – afinal, se tivessem tratado as mulheres com honradez e dignidade desde o começo, não haveria a necessidade de uma ideologia de gênero que instasse as mulheres a lutarem contra a opressão patriarcal. E sabem de uma coisa? Eu concordo: o feminismo é mesmo culpa dos homens.
                                              Por: Felipe Melo
Não, eu não sou feminista, e não, eu não concordo com essa história de patriarcado, falocentrismo, falocracia e outras coisas mais. Mas eu concordo com as (e os) feministas em tributarem na conta dos homens a despesa pelo surgimento do feminismo, ainda que por um motivo totalmente diverso do defendido pelas (e pelos) feministas. A ideologia feminista surgiu não porque os homens sempre foram homens demais, mas porque os homens começaram a ser homens de menos.

Quando paramos para analisar o ideal de masculinidade presente na cultura popular ocidental durante todo o século XX, sobretudo através dos filmes de Hollywood, vemos que há uma disparidade incrível entre o ideal defendido ainda em fins dos anos 1950 e aquele ostentado quatro décadas depois. Nos anos dourados do cinema, os atores que eram tomados e admirados como verdadeiros sex symbols eram substancialmente mais viris. Basta ver imagens de Cary Grant, Humphrey Bogart, Henry Fonda, Gregory Peck, Clarck Gable, Charlton Heston e Rock Hudson (que, ironicamente, era gay), por exemplo, para notar em como esses homens exalavam virilidade: olhar firme, porte ereto, rosto escanhoado, voz grave e bem modulada, modos que não eram delicados, mas que também não eram grosseiros… Mesmo homens de décadas um pouco mais recentes, mas que não eram propriamente belos – Clint Eastwood e Charles Bronson, por exemplo –, chamavam a atenção do mulherio por causa de sua patente masculinidade. Durante anos, esses homens foram mais do que um modelo: eles eram um reflexo do que a sociedade, especialmente as mulheres, esperava de um homem.


Quando se olha para os sex symbols hollywoodianos de hoje, todavia, a situação muda substancialmente de figura. Atores como Robert Pattinson e Daniel Radcliffe se tornaram símbolos sexuais numa senda antitética daquele ideal de masculinidade que ainda se via décadas atrás: feições delicadas, compleição física delgada, modos ligeiramente andróginos, além de certa tendência a uma personalidade afetadamente delicada, sujeita a conflitos existenciais infindos e maçantes, que deixam a porta aberta para relações pautadas por uma carência quase patológica. São figuras masculinas emasculadas, efeminadas, que se assemelham mais a efebos imberbes do que a homens de verdade.

A revolução sexual teve um papel importante nessa transformação tão visível na cultura pop contemporânea. Sob as bandeiras da luta contra o patriarcado e de promoção ao amor livre – uma vez que inconveniências como matrimônio, monogamia e família tradicional são apenas táticas de escravização feminina por parte dos homens –, começou a ser esperado que as mulheres assumissem posturas que são tipicamente masculinas. Não havia mais um sentido de corte, de aproximação, como antes. A mulher passou a recusar o papel de donzela a ser recusada para vestir a pele de mulher dona de si, auto-suficiente, que não gosta de ser paquerada e que prefere ir a campo em busca de um homem que lhe agrade. E que homem seria esse? Alguém sonhador, delicado, sensível, que compartilhasse sua visão libertária da vida e não pensasse em conquistá-la ou cortejá-la da maneira tradicional – o que envolve, por exemplo, a iniciativa e a persistência.

O que os homens fizeram diante disso? Tomaram a decisão mais simples (e, também, pior): cederam. Ao invés de questionar essas idéias meio deslocadas da realidade e resistirem com virilidade, os homens passaram a engolir esse discurso em doses cada vez maiores e cederam. Por quê? Porque era mais fácil. Cortejar uma mulher, conquistar seu coração, casar-se com ela e, depois, fazer jus às responsabilidades de um matrimônio saudável – pagar as contas, fazer compras, educar os filhos, etc. –, são coisas que exigem uma alta dose de firmeza, senso de dever, hombridade e decisão. Essas coisas não são dadas a homem nenhum. Pelo contrário: elas devem ser cultivadas a cada dia através de um esforço verdadeiramente ascético, e nada disso é prazeroso. A virilidade, parafraseando Churchill, é conquistada com sangue, labuta, suor e lágrimas; é o resultado de anos de luta e empenho, e tudo isso custa muito.

Tantas décadas depois da revolução sexual e da entronização do feminismo, as mulheres – algumas delas, inveteradas feministas – têm notado como esse ideal masculino emasculado é ridículo e simplesmente não funciona. Elas têm sentido falta de homens que sejam decididos, firmes, práticos e que saibam ser carinhosos sem aquela pieguice pegajosa tão na moda hoje em dia. Não apenas isso: elas sentem falta de poderem ser mais femininas. As próprias mulheres de hoje já não mais engolem o discurso fácil do feminismo, que transforma a mulher numa caricatura masculina sob a justificativa de lutar contra o patriarcado e as falo-quaisquer-coisas. E, sejamos francos, já passou da hora de os homens deixarem de ser essas figuras moles e queixumentas, afetadas e indecisas, e assumirem o grave dever de serem homens de verdade, com fibra moral e hombridade. É preciso redescobrir o real significado da virilidade.

Artigo publicado no site Revista Vila Nova

Por: Felipe Melo é coordenador do Instituto de Formação e Educação (IFE) em Brasília, blogueiro, jornalista, ensaísta e tradutor.


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