Ser ou não ser santo de pau oco, eis a questão, senhora presidente
Dilma Rousseff. Na seara das relações internacionais não existem
inocentes, não escapa ninguém, nem o Brasil: todos são lobos em pele de
cordeiro. Vejam a reportagem abaixo.
Espiões brasileiros vigiaram diplomatas da Rússia, Irã e Iraque em
suas embaixadas e residências durante operações de contrainteligência da
Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), em 2003 e 2004, segundo
reportagem publicada nesta segunda-feira (4) pelo jornal Folha de S.Paulo.
O veículo teve acesso a um relatório secreto da ABIN que detalha dez
operações realizadas por espiões brasileiros nos primeiros anos do
governo do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo a Folha,
eles seguiram e fotografaram diplomatas russos envolvidos em
negociações de exportação de equipes militares, vigiaram diplomatas
iranianos para tentar identificar seus possíveis contatos no Brasil e
fotografaram atividades dos iraquianos na embaixada do Iraque e em suas
residências.
Em comunicado, o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência
da República afirmou que as operações de contra-inteligência da ABIN
estão previstas na legislação e “obedeceram a legislação brasileira de proteção dos interesses nacionais”, mas que não pode comprovar a autenticidade de um relatório ao qual não teve acesso. “Como a Folha de S. Paulo preferiu não enviar cópia dos documentos obtidos, não podemos validar sua autenticidade.”
A nota diz ainda que o vazamento de relatórios classificados como
secretos constitui um crime e que o governo, sem violar as garantias
constitucionais à liberdade de imprensa, adotará medidas para processar
os responsáveis pela entrega dos documentos.
A divulgação do relatório pela Folha acontece em um momento em que o
ex-técnico da Agência de Segurança Nacional americana (NSA, na sigla em
inglês) Edward Snowden tornou público que o governo americano havia
desenvolvido o maior programa de monitoramento em massa de comunicações
de que se tem conhecimento no mundo. A partir de documentos secretos
entregues por ele a jornais de vários países nos últimos meses, Snowden
mostrou que líderes aliados dos Estados Unidos, como a presidente Dilma
Rousseff, a chanceler alemã, Angela Merkel, e o presidente francês,
François Hollande, foram alvo de espionagem. As denúncias têm causado
uma das piores crises diplomáticas dos Estados Unidos em décadas.
Com a colaboração do jornalista americano Glenn Greenwald, a quem Snowden repassou os documentos sigilosos, no final de julho, ÉPOCA
revelou com exclusividade arquivos que mostram que a NSA espionou oito
membros do Conselho de Segurança da ONU, no caso das sanções contra o
Irã, em 2010. Em seguida, ÉPOCA teve acesso a uma carta
ultrassecreta em que o embaixador americano no Brasil, Thomas Shannon
Jr., agradece o diretor da NSA, general Keith Alexander, pelas
“excepcionais” informações obtidas numa ação de vigilância de outros
países do continente, antes e depois da 5ª Cúpula das Américas, em
Trinidad e Tobago, em abril de 2009. Shannon celebra, no documento, como
o trabalho da NSA permitiu que os EUA tivessem conhecimento do que
fariam na reunião os representantes de outros países. Em entrevista a ÉPOCA,
o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, disse que manter dados em
segredo faz parte do jogo diplomático, mas que a espionagem em
negociações pode configurar uma forma de fraudá-las. “Estamos diante de um escândalo de proporções globais.”
Snowden pede “solução global” para limitar a espionagem.
No caso do Brasil, as denúncias de que a NSA espionou conversas de
Dilma, políticos e empresários, além de atividades da Petrobras, levaram
a presidente a cancelar uma visita de Estado que iria realizar a
Washington em outubro. Críticas à espionagem americana tiveram destaque
no discurso de Dilma na abertura da 68ª Assembleia Geral da ONU. Na
semana passada, Brasil e Alemanha levaram à ONU um projeto com regras
sobre o direito à privacidade na internet. O documento ressalta que a
vigilância ilegal das comunicações e a interceptação constituem “atos
altamente intrusivos que violam o direito à privacidade e à liberdade de
expressão e que podem ameaçar os fundamentos de uma sociedade
democrática”.
Por: Júlio César Cardoso é bacharel em Direito e servidor federal aposentado e mora em Balneário Camboriú – SC – juliocmcardoso@hotmail.com
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