O modelo de urbanização que a maioria das cidades brasileiras adota
é, para uns, motivo de inserção, prosperidade e renda, enquanto, para
outros (inclusive eu), preocupação quanto à qualidade de vida.
Por: Bruno Peron Loureiro
Desde o momento em que a população urbana superou a rural, a cidade
considera-se epicentro das realizações humanas no que se refere a
mobilidade, emprego, opções de comércio e lazer, e novidades
tecnológicas. Deste modo, traços rurais passaram a entender-se como
sinônimo de algo atrasado, retrógrado e obsoleto.
Porém, os critérios com os que se avalia a qualidade de vida em áreas
urbanas e rurais têm mostrado que o que se entendia por atraso e
obsolescência é um equívoco de massas sufocadas pelas promessas da
industrialização nas cidades.
Um destes critérios leva em conta que as cidades brasileiras crescem
materialmente (vertical e horizontalmente) e adensam-se, mas se
deterioram humanamente; noutras palavras, quero dizer que elas trazem
pouca compensação em termos de qualidade de vida aos seus habitantes.
Como comecei este texto demonstrando minha preocupação com o modelo
de urbanização no Brasil, prossigo afirmando que este tem sido o de
enlatar-nos em metros quadrados e o de promover os shopping centers como
único espaço de convívio digno e seguro. Estes não param de aumentar em
número, expandir-se e incorporar novas lojas em quase todas as cidades
de porte médio e grande, até no meio do sertão, como o Shopping Cariri
de Juazeiro do Norte, Ceará.
Mesmo em grandes centros urbanos tidos por sedutores a migrantes,
como São Paulo, a qualidade de vida se mede cada vez mais em função do
desenvolvimento do setor comercial em shopping centers e menos em
relação ao uso de parques e praças. Estes têm sido tomados por
delinquentes e moradores de rua em todo o país.
É realmente difícil falar de qualidade de vida num país onde somente
quem tem muito dinheiro usufrui dos prazeres do consumismo, enquanto a
maioria tira renda de negócios instáveis, pouco rentáveis ou de alguma
das tetas do governo. São muito poucos os que enxergam a dificuldade de
ingresso de renda ao país por meios mais dignos e lucrativos que a soja,
o café, as frutas exóticas e o boi.
Este cenário torna-se mais obscuro quando se toma a cidade de São
Paulo como modelo de desenvolvimento urbano quando ela não passa de uma
“selva de pedra” esfumaçada, estressante e entregue à delinquência.
Lamento que a capital do estado onde nasci deteriora-se. Sua qualidade
de vida é bem mais baixa em comparação com Curitiba, que é uma cidade
mais arborizada e planejada.
Creio que Curitiba é hoje o melhor que alguma cidade de grande porte
alcançou no Brasil em termos de qualidade de vida e sustentabilidade em
sua urbanização.
Cidades médias e grandes têm cada vez mais dificuldade de investir em
parques e outras áreas verdes, onde a população possa respirar ar puro.
Um dos motivos é a expansão do uso dos terrenos e imóveis sobre áreas
que deveriam ser de preservação ambiental, mas se transformaram em
objetos de expansão predial.
No Brasil, temos visto um inchaço populacional, urbano e comercial
com pouquíssima sustentabilidade. Já passamos dos 200 milhões de
habitantes e cada um de nós precisa ter condições dignas de
sobrevivência (alimentação, moradia, saúde, transporte, etc.). Damos
despesa enorme para a sociedade e a natureza, porquanto mais tiramos
delas que repomos. Precisamos aprender a devolver ao planeta aquilo que
subtraímos dele para nossa sobrevivência. Uma das maneiras de fazê-lo é
ter maior consciência sobre como melhorar nossa qualidade de vida e, ao
mesmo tempo, manter uma relação sustentável entre ser humano e natureza.
Só assim faremos uma revisão do modelo de urbanização que queremos em
nosso país a ponto de descartar o de São Paulo como um embuste com
sotaque forjado.
Cidade sustentável é aquela que cuida dos seus moradores em vez de
garantir que até junho de 2014 tantos estádios se construam e se
reformem para o futebol.
As decisões sobre qualidade de vida dependem de você, leitor. Sua
palavra terá voz quando optar entre mais cimento à sua volta ou mais
harmonia com a natureza.
Por: Bruno Peron Loureiro é mestre em Estudos Latino-americanos pela FFyL/UNAM (Universidad Nacional Autónoma de México). http://www.brunoperon.com.br
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