Desde que o
primeiro astronauta brasileiro se aposentou, já passou da hora de arranjarmos
um substituto. Minha sugestão é o atual presidente da Câmara dos Deputados,
Henrique Eduardo Alves. Ele já parece bastante treinado para a tarefa, na
medida em que a noção de gravidade já não faz mais efeito sobre as coisas que
faz e fala.Por: Antonio Lassance
Na semana em que o
Brasil se despedia de 2013, Alves fez um pronunciamento em rede nacional de
rádio e TV para falar do que a Câmara fez e do que pretende fazer em 2014.
Em seu pacote de
Natal, Alves colocou como prioridade a sua reforma política.
Quem diria? Em ano
eleitoral, com esforço concentrado e recesso prolongado para que os
parlamentares façam campanha, Alves fez uma aposta ousadíssima. A reforma
anunciada tem como pontos prioritários:
- O financiamento
das campanhas;
- A reeleição do
Executivo;
- O fim do voto
obrigatório.
No pronunciamento,
essas questões vieram empacotadas sob o slogan “o poder dos brasileiros”,
possivelmente para aproveitar o período natalino, quando as pessoas ficam um
pouco mais propensas a acreditar em Papai Noel.
O financiamento de
campanha de Alves é a defesa intransigente e apaixonada de que os políticos
continuem autorizados a receber grandes somas de dinheiro vindas de empresas.
Tanto Henrique
Eduardo Alves quanto Renan Calheiros, outro que gosta de voar e também poderia
ser posto na fila de nosso programa espacial, indignaram-se com o fato de o
Supremo Tribunal Federal (STF) estar prestes a proibir o financiamento de
empresas a campanhas políticas. Dos 11 ministros do Supremo, quatro já
encaminharam a favor da proibição. A decisão final do STF pode ter um grande
impacto na sorte (ou azar) de muitos candidatos. Tomara.
O tópico que
pretende proibir a reeleição para cargos do Poder Executivo (presidente da
República, governadores e prefeitos), deixa a pergunta no ar: e por que não
para o Legislativo? A reeleição no Executivo é limitada a uma única vez
consecutiva. Nem isso o Legislativo cogita para si próprio?
Será que esse
bloqueio mental do presidente da Câmara para uma proposta dessa natureza tem
algo a ver com o fato de ser ele deputado federal há quatro décadas (desde
1971), ininterruptamente? Se houvesse limitação aos mandatos parlamentares, o
grau de renovação congressual seria maior. Contribuiria em parte com o desejo
de muitos brasileiros de mandar uma parte da política tradicional para outros
planetas – nem que fosse por um intervalo de quatro anos.
A defesa do voto
facultativo virou o atalho pelo qual os políticos mais tradicionais querem
transformar a revolta popular em apatia, trocando manifestação nas ruas por
abstenção eleitoral.
Enfim, o fato é
que vem aí um pacotão de reforma política, a ser levado a plenário entre março
e abril de 2014. Prepare o seu coração. O pacotão preparado sob a batuta da
pior presidência da Câmara desde Severino Cavalcante coloca a política na
contramão do bom senso e tende a torná-la menos participativa e ainda mais
dependente do poder do dinheiro do que já é.
A única defesa
contra o rolo compressor que vem por aí depende de se levar a disputa na Câmara
às últimas consequências. Significa manter a Casa, sob a presidência de Alves,
como tem sido nos últimos meses, tal e qual uma mula empacada.
Dilma usou, para
isso, o poder que a presidência da República tem de pedir urgência na
tramitação parlamentar de projetos do Executivo. É o caso do projeto do marco
civil da internet. Sem acordo, o projeto empaca as votações do Congresso. É
ruim, pois questões importantes, a começar da própria regulamentação da
internet no Brasil, ficam sem decisão.
Mas é melhor do
que projetos que piorem o que já não está bom. Até as eleições, a presidência
vai ter que se virar mais com decretos do que com medidas provisórias e
projetos de lei. A não ser para sinalizar sua agenda, mas deixando tudo para
votar, com segurança, em 2015, com uma nova correlação de forças. Essa agenda
também funcionaria como parte do próprio programa eleitoral de Dilma.
Sobre reforma
política, uma grande responsabilidade recai sobre o PT, que é o maior partido
da Câmara. O PT precisaria fazer maioria para derrotar a pauta-bomba de Alves
ou, pelo menos, mobilizar outros partidos e rachar o PMDB para obstruir
votações. Teria que começar enquadrando seus parlamentares, como Cândido
Vaccarezza (PT-SP), que preside de bom grado a comissão que é a menina dos
olhos do presidente da Câmara. De bem com Alves e às turras com o PT,
Vaccarezza é justamente o encarregado de embrulhar o pacotão do presidente da
Câmara .
Ou seja, o ano
começa de cabeça para baixo. O PT, que tem no PMDB seu principal aliado e
passou 2013 reclamando do STF, terá que derrotar o PMDB na Câmara, sem dó nem
piedade, e defender o STF, com unhas e dentes, por fazer aquilo que o
Legislativo se mostrou incapaz: colocar fim ao enrosco de gafieira em que se
meteram os partidos e seus políticos, em seus ternos engomados, com as empreiteiras,
os bancos e as grandes empresas concessionárias de serviço público, que usam
minissaias convidativas, espartilhos cheios de dinheiro e desfilam de
salto alto pelos corredores e lobbies do poder.
Por: Antonio
Lassance, doutor em Ciência Política. Carta Maior/Via: Viomundo
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