Juiz eleitoral escreve sobre
financiamento de campanha eleitoral
Por Herval Sampaio Junior
O problema do
financiamento das campanhas eleitorais não é tão fácil de resolver, como
defendem alguns com a perspectiva de que basta tão somente transformar o
financiamento das campanhas em estritamente público, alterando a normatização
do atual sistema que é misto, em que se permitem doações/investimentos do setor
privado e cotas do fundo partidário.
Nessa linha,
tais defensores acreditam que todos os problemas relativos ao chamado, por
exemplo, caixa dois estaria totalmente resolvido, pois empresas grandes como as
empreiteiras não poderiam mais doar/investir nas campanhas eleitorais. Ledo
engano, com todo respeito a quem pensa em contrário, pois o problema é bem
maior do que se imagina e primeiro temos que ter a preocupação com o chamado,
vamos chamar assim para facilitar a compreensão Caixa um, ou seja, as doações
que de doação não tem nada, e sim investimento e que são autorizadas pela
legislação, independentemente hoje, de ser pessoa física ou pessoa jurídica e
mais sem qualquer limite máximo de gastos, logo, olha que problema
interessante, já temos hoje com o atual sistema e que ninguém está conversando
com relação à reforma do sistema político que se avizinha, quando a legislação
eleitoral, não prevê limite máximo de gastos entre os candidatos e nem sequer
mínimo.
Já temos aqui,
com todo respeito, nesse sistema uma aberração, pois aqueles que já entram numa
campanha eleitoral, mal intencionados e não são poucos, ou seja, com a ideia
clara de fingir, que estão verdadeiramente prestando conta real, substancial
dos gastos e principalmente receitas obtidas para o desenvolvimento da
campanha, optam por óbvio em colocar os seus limites de gastos bem acima,
justamente para não terem quando, com todo respeito, do faz de conta da análise
das contas que serão submetidas à Justiça Eleitoral suas contas reprovadas.
Porque será?
Justamente porque colocando um valor maior, poderá
dentro do que permite a própria legislação arrecadar e ao mesmo tempo gastar no
chamado, caixa um, valores que seriam bem maiores do efetivamente existente. E
esta essa saída formal em se colocar um limite máximo do valor que entenda
pertinente, o candidato e o partido politico conseguem, por exemplo, se safar
de uma eventual punição, acaso não tenha feito uma previsão correta e real dos
gastos.
Se porventura
houvesse obrigação de se estipular tetos sobre a previsão de gastos, o próprio
candidato e o partido político teriam mais cuidado na hora de designar o
intervalo pelo qual estaria obrigado a gastar, mesmo que formalmente. E agora
vejam como sempre colocam valores à maior do que efetivamente gastarão, mesmo
com outro problema que vamos em seguida abordar, que é o problema do Caixa
dois, sempre acabam fraudando o sistema pelo que estamos chamando de Caixa um.
E aqueles que
resolvem muitas vezes por inocência e às vezes por total desconhecimento da
lei, colocam valores menores, basta ter uma receita, que no decorrer da
campanha um pouco maior e que não era previsível, que já serão devidamente
punidos, por força, justamente da não adequação formal as regras previstas em
lei e nas resoluções do Tribunal Superior Eleitoral, mas o problema das contas
de campanha não reside tão somente na análise formal e técnica das contas
prestadas, inclusive com a submissão a diversas regras, que ao longo dos
últimos anos até houve uma evolução no sentido de se apertar, ou seja, de se
querer fazer com que os partidos e candidatos se submetam a um rigor bem maior
em termos de controle, inclusive tentando chegar na medida do possível, ao
efetivo gasto e receita feita pelos mesmos.
Entretanto o
problema maior reside no fingimento, com todo respeito, das próprias prestações
feitas na maioria das vezes pelos candidatos e partidos políticos desse país,
afora o problema já relatado; é indiscutível, portanto, que as campanhas
eleitorais custam bem mais, consoante se pode claramente vê nas ruas, do que o
devidamente informado pelos candidatos e partidos políticos, e essa constatação
infelizmente acontece em todas as eleições e pode ser facilmente detectada com
análise das campanhas eleitorais passadas, incluindo especialmente a campanha
eleitoral de 2014, que foi a mais custosa de todas e a mais cara de todo o
mundo, chegando a quase 05 bilhões em termos de caixa um, segundo informado à
Justiça Eleitoral.
Ora como sempre venho dizendo a regra geral nesse tema
é que os candidatos fingem que prestam conta e infelizmente, por falta de
estrutura da Justiça Eleitoral, ela também finge que homologa e aprova
formalmente as contas. Ora é até mesmo contraditório se interpretar
sistematicamente todos os textos normativos que tratam não somente das
campanhas eleitorais, mas principalmente das eleições de um modo geral, e
veremos que o espírito é conter as diversas formas de abuso de poder.
Então se
indaga se existem diversos textos normativos que procuram coibir, inclusive
punindo de forma severa, retirando, em algumas situações, o mandato conquistado
por abuso do poder econômico, como que a Justiça Eleitoral pode analisar
substancialmente e materialmente se são verdadeiras as informações trazidas
pelos candidatos e os partidos políticos na prestação de contas analisadas sob
o crivo meramente formal?
Tal
constatação, com todo respeito a quem pensa ao contrario, já é, por si só,
difícil de compreensão, se por um lado a legislação eleitoral é rigorosa do
combate ao abuso do poder econômico, do outro justamente na prestação de contas
de campanha há uma interpretação hoje que a analise é feita tão somente no viés
formal, sem que a justiça eleitoral possa na prática analisar materialmente se
todas aquelas receitas se operaram da forma descrita e o mais importante se
aquelas despesas ocorreram da forma devidamente alinhada na prestação de
contas, pois infelizmente, por nossa experiência de quase 16 anos como juiz e
tendo presidido diversas eleições, percebemos claramente que na grande maioria
os candidatos e políticos criam uma receita e despesa totalmente diferente da
real, havendo de fato dois caixas.
Portanto,
parece-nos ser notório hoje que os candidatos e partidos políticos colocam
valores totalmente diferentes dos valores reais na prestação de contas, ou
seja, a maioria dos candidatos, no chamado caixa um, na regularidade formal das
contas que buscam colocam os valores de despesas informados bem menores do que
os valores de mercado.
Tivemos uma experiência recente em que infelizmente,
por fazer esse trabalho além do viés formal, nos deparamos com situações muitas
vezes visíveis a olho nu como se diz, em que constatamos que algumas prestações
de contas chegaram realmente a valores absurdos, inclusive valores que
sinceramente poder-se-ia pensar que os candidatos e partidos estariam “tirando
onda” da Justiça Eleitoral, pois informaram valores totalmente irreais.
Portanto,
somente uma efetiva fiscalização, transformando ou criando agentes públicos,
dentro da estrutura eleitoral que pudessem, a partir inclusive do dever
indiscutível de fiscalização por parte dos juízes eleitorais, chamado de poder
de polícia, teríamos resultado concreto de se coibir na prática o chamado caixa
dois. Tais servidores, na fase de propaganda, poderiam inclusive passo a passo
analisar materialmente todos os atos e informações prestadas pelos candidatos,
em especial os atos de propaganda, a partir da realidade do valor de mercado e
o que se via na rua pelos juízes e servidores referidos.
Nessa última
eleição, nós vimos claramente por diversos candidatos uma estrutura gigantesca,
uma estrutura inclusive para a cognição do que estamos a explicar totalmente
surreal quando vamos analisar as contas informadas, os valores são totalmente
irreais e o que fazer, segundo a Justiça Eleitoral, com todo respeito, nada,
pois a análise é feita somente no aspecto formal, se foram observados os
procedimentos, se foram observados os prazos com relações às informações,
assinaturas nos recibos competentes e outras diretrizes técnicas contábeis.
Ora essa
análise também é importante, inclusive vem sendo feita com rigor maior nos
últimos anos, porém nós temos que avançar para fiscalizar, substancialmente, se
todos aqueles valores condizem com os valores de mercado, analisar justamente
se dentro do chamado caixa um tudo foi devidamente observado e principalmente
junto com essa fiscalização e junto evidentemente com o dever de cumprimento e
de fiscalização das demais normas, se houve abuso de poder econômico já na
prestação de contas, mesmo que indiciária, a partir do que o juiz e sua equipe
de fiscalização viram nas ruas.
Desta feita, o que propomos é uma ação mais
contundente da Justiça Eleitoral para conter o abuso de poder e tentar
justamente aferir os outros gastos que com certeza acontecem, além do que fora
devidamente informado e que é conhecido hoje, pelo chamado caixa dois.
Ora por fim,
resta-nos uma seguinte indagação e observação ao mesmo tempo, se porventura
trocarmos o sistema misto de análise das campanhas eleitorais pelo
financiamento de campanhas totalmente público, como alguns defendem claramente
e este signatário também até entende que o atual sistema tem que ser
modificado, estará resolvido todos os problemas aqui apontados?
Para nós a
resposta é não, pois em se adotando de forma mais intensa o financiamento
público exclusivo das campanhas eleitorais, resta-nos uma preocupação, será que
não se resolvendo o problema, a partir de uma maior estrutura e fiscalização
efetiva que se defende por parte da Justiça Eleitoral e os demais órgãos e
entidades envolvidos em tal fiscalização, vedando-se qualquer tipo de
financiamento privado das campanhas eleitorais, a situação pode é piorar, já
que a nossa cultura de jeitinho brasileiro para burlar a lei, as
doações/investimentos serão mais constantes e até maiores, por acreditarem
justamente na ausência de fiscalização.
Hodiernamente,
sabemos que o que se chama de doação, na realidade é investimento, pois as
empresas investem, por incrível que pareça em partidos e candidatos com
ideologias distintas, logo dá para acreditar que resolveremos ou minimizaremos
esses problemas existentes. Repito, não tenho duvida em afirmar que não, pois o
chamado caixa dois continuara ocorrendo se não houver justamente essa mudança
cultural e uma maior estruturação, estruturação essa humana, estruturação essa
material, estruturação tecnológica com maior preocupação em criar um corpo
eleitoral fiscalizatório e principalmente permitindo claramente ao juiz
eleitoral, que a partir dessa estruturação, possa analisar materialmente todas
as contas das campanhas eleitorais.
Para nós, com todo respeito, retirar o financiamento
hoje misto, deixando totalmente puro com recursos públicos, proibindo as
empresas de doarem para as campanhas eleitorais, por si só, sem essa outra
preocupação nossa que ao longo dos anos e nossa experiência a gente vem se
preocupando, com todo respeito a quem pensa em contrário, não resolverá.
Simplesmente
mudaremos o foco do problema, realmente, mais uma vez, avançaremos formalmente
e continuaremos, por óbvio, com as chamadas doações ilegais, investimentos na
realidade ilegais e que mais uma vez fugirão ao crivo de análise do Judiciário.
Sem tal estruturação da Justiça Eleitoral, continuaremos com as campanhas com
alto custo e principalmente o famoso investimento, em que as empresas
investirão ilegalmente e procurarão no decorrer no exercício do mandato daquele
que fora ajudado de forma ilegal a recuperação daquele dinheiro, com todo
respeito àquele que pensa o contrario, as empresas em nossos pais, e a prática
vem demonstrando não estão sendo caridosas, pelo contrário estão fazendo
negócios, inclusive altamente lucrativos para seus balancetes, para seus
executivos e infelizmente a realidade hoje demonstra isso como enunciado em
nota de rodapé.
Por isso, a
solução para o problema do financiamento de campanha não é tão simples quanto
se pensa, temos que discutir e estudar nessa reforma do sistema político que se
avizinha, a partir de uma maior estruturação da Justiça Eleitoral, que possa
passar a analisar substancialmente as contas das campanhas eleitorais
informadas, por força justamente das obrigações, hoje já formais com relação ao
dever de regularidade nas prestações de contas, evitando desde essa fase do
processo eleitoral o famigerado abuso de poder econômico, que na prática é a
origem de todas as outras formas de abuso de poder e da captação ilícita de
sufrágio, a qual infelizmente em nosso país vem em algumas situações se
constituindo como uma política institucional de alguns governos ainda mal
acostumados com a politicagem assistencialista.
Via: Carlos Skarlack
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