Reforma do ensino público

Resultado de imagem para escolas fotosA reforma do ensino médio demanda uma outra reforma

Os recentes resultados divulgados do IDEB trouxeram de volta ao debate da sociedade as graves dificuldades enfrentadas na aprendizagem dos jovens brasileiros. Os resultados negativos reforçam a percepção de que o atual currículo do Ensino Médio é ultrapassado e merece profunda reforma. Um dos maiores desafios do Brasil é aumentar a atratividade das aulas, dando mais dinamismo ao processo ensino-aprendizagem, estimulando o protagonismo juvenil e reconhecendo as diferenças individuais e geográficas dos alunos, alinhados com a ampliação dos programas da formação inicial e continuada dos professores.
Como consequência deste cenário, o Governo Federal editou a Medida Provisória (MP) 746/2016, que se junta ao Projeto de Lei 6.840/2013 que já tramitava no Congresso Nacional, que propõe alteração da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), tendo como pilar a instituição de jornada em tempo integral no Ensino Médio, e a reorganização do currículo por áreas de conhecimento.
Entre os maiores interessados nessas mudanças estão as Secretarias de Estado de Educação, responsáveis pela maioria dos alunos deste segmento de ensino. Esses avanços, no entanto, criam um dilema: por um lado, a MP traz sugestões importantes que realmente trarão melhoria ao Ensino Médio. Por outro lado, até em função da crise econômica, não há no cenário atual como dar sustentabilidade financeira a estas importantes reformas. O projeto, por exemplo, estabelece jornada escolar de pelo menos sete horas diárias e determina que pelo menos 50% das matrículas em 50% das escolas estejam em horário integral em um prazo de 10 anos. O prazo para a implantação universal nas redes seria de vinte anos.
Além disso, e nada mais coerente para a solidez dessa iniciativa que é louvável e desejada, a MP prevê a possibilidade de opção formativa ao estudante no último ano, podendo este seguir a ênfase em “linguagens”, “matemática”, “ciências da natureza”, “ciências humanas” e “formação profissional”. Para poder acompanhar as melhorias implantadas no ensino integral diurno, as turmas noturnas teriam um ano a mais passando para quatro anos de duração. Tais medidas envolverão, na maioria das escolas, um rearranjo em salas de aulas disponíveis, o que nem sempre é possível sem fazer grandes adaptações e consequentemente diversas obras.
Os planos são os melhores possíveis, mas nosso desafio também é matemático. Para dar um exemplo, no Estado do Rio de Janeiro tem atualmente aproximadamente 446 mil alunos no Ensino Médio Público. Dentre eles, 42 mil alunos em horário integral. Alcançar o patamar de 50% das matrículas em horário integral em dez anos significará o equivalente à necessidade de implantação de mais de uma centena de novas unidades escolares, considerando os importantes reflexos na folha de pagamento e nos recursos de merenda e manutenção. Com as metas estabelecidas pela MP, nos cálculos preliminares, o Estado do Rio de Janeiro teria que construir dezenove unidades escolares anualmente nos próximos vinte anos. Nos valores de hoje, ao fim da implantação e sem considerar o investimento nas novas escolas, o aumento estimado em gastos poderia chegar a R$ 1,5 bilhão ao ano, com reflexos atuariais futuros e permanentes na previdência estadual.
Os debates sobre o financiamento da educação também nos remetem ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB) e à compreensão equivocada de que os recursos direcionados a todos os estados são procedentes de tributos federais. Diferentemente do que se entende no senso comum, o FUNDEB na maioria dos estados não recebe recursos federais. O FUNDEB destinado ao Rio de Janeiro, por exemplo, é financiado basicamente pelo ICMS do estado. Essa transferência estadual é a principal fonte de receita dos municípios do Rio de Janeiro para as políticas de educação infantil e do ensino fundamental. No ano passado, os recursos da arrecadação de ICMS repassados ao fundo que não foram revertidos diretamente à rede estadual chegaram a cerca de R$ 3 bilhões.
Somadas a essas dificuldades, a importante e necessária ampliação da oferta de vagas nas creches públicas gera outro reflexo que não pode ser desconsiderado: aumenta-se o denominador de alunos e entes que compartilham os mesmos recursos do FUNDEB sem que haja a alteração no numerador desta equação. Ou seja, cada vez mais cidadãos e administradores dos estados e municípios disputam as mesmas verbas. O tema torna-se ainda mais crítico e controvertido se se soma a ele o debate em torno da eventual desvinculação das receitas voltadas para a educação prevista na PEC 241/2016, em discussão no Congresso Nacional, que prevê limitar o crescimento dos gastos públicos inclusive por segmentos, isto sem falar a redução dos repasses previstos pelo Salário Educação que tem caído vertiginosamente em função do desemprego e desaceleração econômica. Portanto, mesmo com as necessárias melhorias na gestão dos recursos por parte de todos ente federativos, se não tivermos a revisão e a apresentação de novas fontes de financiamento, o futuro da educação pode ser mais sombrio do que o presente.
Assim como o Ensino Médio, o desenho do financiamento à educação pública – tão bem-sucedido na universalização do ensino fundamental após a Constituição de 1988 – precisa ser reformado. Para que a vitória daqueles que almejam uma educação de qualidade para os jovens brasileiros não se torne mais uma lei classificada como “letra morta”, é fundamental que a aprovação da MP traga consigo também os caminhos para colocar esse projeto verdadeiramente de pé e que uma questão fundamental se responda: Haverá um novo imposto ou fonte com recursos significativos e permanente destinada a financiar fundo reservado para este fim? Essa pergunta não pode ficar sem resposta já que as propostas sem o equacionamento financeiro podem não levar ao importante resultado esperado por todos.
*Wagner Victer é morador da Ilha do Governador, Engenheiro de profissão, Conselheiro do Clube de Engenharia e Membro Efetivo da Academia Nacional de Engenharia, ex-presidente da CEDAE – Companhia Estadual de águas e Esgoto do Rio de Janeiro e da FAETEC/RJ, atualmente é o secretário estadual de Educação do Estado do Rio de Janeiro. Também é Conselheiro do Fluminense Football Club.

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