Por muitas vezes, a vontade de aprender é maior do que a possibilidade
de ter uma pessoa capacitada e com tempo disponível para nos ensinar. Com isso,
cabe ao aluno se lançar à própria sorte e buscar o conhecimento. É o chamado
autoaprendizado. O que pode parecer uma necessidade, na verdade apresenta
muitas vantagens. É o que garante o professor Pedro Demo (doutor em sociologia
com PhD na Alemanha e nos EUA).
Autor de livros sobre o assunto como "Metodologia para Quem quer
Aprender" (editora Atlas), Demo afirma que o autodidatismo ajuda na
criatividade e pensa que o próprio ensino tradicional deveria dar mais
autonomia para o estudante. Nesta entrevista, ele dá dicas para quem quer
estudar por conta.
Porém, logo avisa: não há esquema pronto para aprender por conta. O
estudante é que tem de descobrir o que é melhor para ele.
Existem
técnicas que podem tornar o autoaprendizado mais efetivo?
Pedro Demo - Há sugestões do tipo autoajuda que
são enganosas porque prendem o estudante a esquemas. Parte da
aprendizagem significa libertar-se de esquemas rígidos em nome da autonomia. Não havendo fórmula pronta, a
sugestão é caprichar nas "habilidades" como saber pensar, pesquisar,
elaborar, questionar, perguntar, duvidar...
Pensando
nisso, como o estudante pode aprimorar essas habilidades?
Um pouco dessas habilidades vêm da própria pessoa,
mas com certeza podem ser melhoradas na vida, na boa escola (que permite ao
aluno refletir e criar). Exercitar a autoria é uma boa forma
de a pessoa aprender a pensar, já que acaba exercitando o "saber pensar".
Para quem gosta, bons
videogames ajudam a pessoa a resolver problemas. Um exemplo é o Sim City, no qual a
pessoa tem que administrar uma cidade.
Como o
estudante pode organizar um plano de estudo sozinho?
Quem deve pensar no plano de
estudo é o próprio aluno. Ao analisar a dificuldade da disciplina que quer aprender, ele pode
dividi-lo em partes e estipular um tempo de aprendizado. Para desenvolver a autonomia,
qualquer pessoa precisa organizar-se, tomar iniciativa, saber pensar,
questionar e se autoquestionar.
O aluno também deve pensar em quais
tipos de apoio podem ajudar. Existe uma metodologia chamada Scaffolding, no qual o estudante começa
com um apoio no aprendizado e cada vez menos necessita dele. Também é muito
importante imergir no assunto. Uma boa forma de fazer isso é exercitar a
autoria, já que para criar é preciso estudar muito.
No livro
"Metodologia para Quem Quer Aprender", você cita que disciplina e
indisciplina são necessárias para quem quer estudar. Por quê?
É preciso ter disciplina, porque o estudo
rende melhor em condições ordenadas: com horário, com pontualidade e com coordenação.
Mas a criatividade é mais
inspirada na indisciplina, na habilidade de sair da rotina. Indisciplina não significa quebrar
tudo, agredir os outros, apontar confusão, mas saber divergir, perguntar, duvidar, buscar
outros caminhos.
Muitas
pessoas se dizem "autodidatas". Isso significa que nem todo mundo é
capaz de aprender sozinho?
Há pessoas autodidatas, no sentido de que sabem aprender por si, pois
possuem boa cabeça, usam lógica com facilidade, induzem e deduzem, inferem,
sacam soluções. No fundo, todos podem aprender sozinhos, porque aprendizagem é
algo sozinho, de dentro para fora. A escola, em geral, tolhe a iniciativa
própria, porque é uma instituição autoritária e instrucionista.
"Ensina", mas não cuida que se aprenda.
Em que
sentido as novas tecnologias podem ajudar no autoaprendizado?
Tecnologia pode ajudar e atrapalhar. Elas servem para pesquisar,
elaborar e questionar. Mas também podem ser usadas para plagiar, copiar, e
enganar. Cabe ao aluno ter consciência de usá-las bem.
Além dos videogames, há bons
recursos tecnológicos como programas de exercícios e apostilas. Porém, o ideal é ter consciência de
que não devemos nos prender a apenas um apoio. Ficar só com internet é pobreza,
porque a história tem um acervo imenso de construção de conhecimento que vem
antes da web.
Por que há
muitas pessoas autodidatas que se dão bem em áreas como tecnologia e negócios?
Em toda história, a tecnologia é o grande emblema da criatividade
humana. De certa forma, criar o que é novo faz parte da própria tecnologia. E
para criar o que é novo, há de se fazer sem professor. Neste sentido, podemos ver
que a autoria ajuda muito quem busca o autoaprendizado.
Quais são as
principais vantagens do estudo por conta. E desvantagens?
Vejo como principal vantagem o exercício da pessoa ter que buscar
soluções para as próprias fraquezas. Com certeza ajuda no autodesenvolvimento.
Por outro lado, há o risco da pessoa que faz tudo sozinha não desenvolver a
autocrítica, pois não tem um nível de comparação. Só é importante também pensar
em outra coisa: estudo por conta não significa isolar de tudo e todos. Quando for
preciso, vale buscar ajuda.
Você
acredita que o ensino da forma tradicional nas universidades pode ser
substituído por novos métodos de autoaprendizado?
Deve, porque o "ensino" hoje é um disparate instrucionista. É
preciso inventar sistemas de "aprendizagem", nos quais professores e
estudantes se encontram para aprenderem juntos, exercitando a autoria. Ao lado
do conteúdo que todo mundo precisa dominar para tornar-se profissional, é
importantíssimo desenvolver habilidades autorais. Quem sabe essas habilidades,
sobrevive aos tempos. Quem só escuta aula, falece na primeira esquina.
Por: Edgard Matsuki, educação.com.brAmpliar
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