Luís Alexandre é um dos quatro auditores fiscais suspeitos de participar de um esquema. Ele, Carlos Augusto di Lallo, Eduardo Barcelos e Ronilson Bezerra são investigados por cobrar propina de construtoras para que elas pagassem menos Imposto Sobre Serviços (ISS). A fraude, investigada pelo Ministério Público, pode chegar a meio bilhão de reais.
No dia 30 de outubro, os quatro auditores foram presos e ficaram detidos na carceragem do 77º distrito policial, em Santa Cecília, região central da capital. Luís Alexandre fez acordo de delação premiada e foi libertado no dia 4 de novembro. Os demais suspeitos de envolvimento na fraude foram soltos na madrugada do dia 9 de novembro, depois de encerrar o prazo para o pedido de prisão provisória. Na véspera, por meio de nota, a Prefeitura já havia anunciado o afastamento por 120 dias dos três auditores que ainda permaneciam presos.
“Eu vou responder pela parte que eu fiz. E aí, o resto é com a Justiça”, declarou, em entrevista exclusiva, na qual dá a versão dele para o esquema de corrupção pelo qual é investigado.
Abaixo, leia a íntegra da reportagem do Fantástico:
Luís Alexandre Magalhães, auditor fiscal da Prefeitura de São Paulo investigado por corrupção – “Entre hotel, jantar e mulher, já cheguei a gastar R$ 8 (mil), 10 mil reais”.
Fantástico – “Com dinheiro da corrupção?”
R – “Isso!”
Luís Alexandre Cardoso de Magalhães é um dos quatro auditores fiscais suspeitos de participar de um esquema de corrupção na Prefeitura de São Paulo.
Ele, Carlos Augusto di Lallo, Eduardo Barcelos e Ronilson Bezerra são investigados por cobrar propina de construtoras para que elas pagassem menos ISS - o Imposto Sobre Serviço. A fraude pode chegar a meio bilhão de reais. “Eu vou responder pela parte que eu fiz. E aí, o resto é com a Justiça”, declarou.
Fantástico – “Por que que você resolveu denunciar todo o esquema?”
R – “No momento que fui preso, eu estava com muito medo de perder a guarda do meu filho, né? Então, eu entendi que a minha melhor participação nisso era assumir a parte que me cabe. Na verdade, eu revelei como a gente operava.”
O auditor revela: as empresas envolvidas no esquema conheciam a fraude e sabiam até quem seria o subsecretário de finanças, antes mesmo que o nome fosse anunciado pela Prefeitura.
Fantástico – “As empresas não são vítimas?”
R – “Não! Quem queria participar já procurava a gente. A construção civil sabia quem ia ser o chefe do setor antes mesmo de ser nomeado.”
P – “E quando elas chegavam, como que era essa conversa?”
R – “Tinha obra que devia muito. Então, eles sugeriam já, eles já sabiam como funcionava, já sugeria participar daquela situação.”
Luís Alexandre explica que as construtoras, muitas vezes, chegavam a pagar apenas a metade do que deviam aos cofres públicos. E dessa metade, só uma pequena parte era recolhida como imposto. O resto virava propina.
Fantástico – “O dinheiro da fraude era dividido em partes iguais ou não?”
R – “O que sobrava dividia em quatro.”
P – “Em média, quanto que cada um recebia?”
R – “O Ministério Público insistiu nessa pergunta: às vezes, eram 70 (mil reais). Às vezes, eram 30 (mil reais). Às vezes, 40 (mil reais).”
P – “Por semana?”
R – “Por semana!”
E segundo o auditor fiscal, tudo em dinheiro vivo.
P – “No seu depoimento, você fala que chegou a levar dinheiro na própria Prefeitura, no 11º andar. Isso acontecia?”
R – “Aconteceu! Porque a gente trabalhava em um prédio e o subsecretário fica em outro prédio.”
Na época, o auditor Ronílson Bezerra era o subsecretário de finanças. Ele era o mais ansioso na hora de receber a propina, diz Luís Alexandre.
Luís Alexandre – “Ele queria na hora. Aconteceu uma situação de manhã, até a tarde tinha que estar com ele. Uma aflição absurda!”
P – “Como que era feito esse transporte?”
R – “Em pacote, uma sacola.”
Questionado sobre o envolvimento de políticos no esquema e o financiamento de campanhas, Luís Alexandre desconversou.
Luís Alexandre – “Não sei te falar. Eu vou até aonde vai a minha participação. Nunca ouvi falar nada sobre isso.”
P – “A tua participação...”
R – “Era até o subsecretário.”
De acordo com Luís Alexandre, só Ronílson tinha contato com políticos.
Luís Alexandre – “Não tinha nem contato no dia a dia com o subsecretário para saber com quem ele falava, com quem ele se relacionava.”
Fantástico – “Para quem que você deu dinheiro durante todo esse tempo?”
R – “Ué, para o Lallo, para o Barcellos e para o Ronílson.”
O advogado de Ronílson Bezerra não quis comentar as declarações de Luís Alexandre. O de Carlos Augusto di Lallo disse que o cliente dele não recebeu propina. Já o advogado de Eduardo Barcellos confirmou que o auditor recebeu dinheiro de construtoras.
A reportagem do Fantástico questionou Luís Alexandre sobre o destino do patrimônio dele. Ele chegou a falar com uma funcionária de um banco em Miami, Estados Unidos, segundo conversa gravada por escuta telefônica.
Gravação:
Luís Alexandre – “Qual é o assunto que a senhora quer tratar comigo, dona Vera?”
Vera – “Eu estou falando a respeito da conta ‘concentração’.”
Fantástico – “Você tem conta em Miami?”
R – “Não.”
P – “E o teu patrimônio? Você comprou com dinheiro da corrupção, da fraude?”
R – “Eu gastei muito dinheiro na noite.”
P – “Com o quê? Saía a noite?”
R – “É. Cada um teve a sua compulsão, né? Eu tive uma... Eu comecei a ficar compulsivo por sexo. Eu frequentava alguns locais que eram frequentados por garotas de programa e, às vezes, eu chegava às 4h da tarde e saía às 6h da manhã. Ia em casa e tomava um banho e ia trabalhar.”
Luís Alexandre revela que já pagou até R$ 5 mil por um programa com uma mulher que conheceu em uma boate.
Fantástico – “Gastava quanto em uma noite?”
R – “Eu nunca tomei vinho de R$ 4 mil. Mas já paguei para algumas pessoas que já saíram em capas de revistas: R$ 5 mil para a mulher.”
Com o dinheiro da propina, Luís Alexandre levava uma vida luxuosa. Viajava para Angra dos Reis, no Rio de Janeiro, em avião particular, sempre com garotas de programa.
“Ficava sábado e domingo em alto mar, voltava às vezes, segunda de manhã. Fiz isso algumas vezes. Não com as mesmas meninas, né? Levava uma, aí em uma outra viagem levava duas”, conta o auditor fiscal.
O avião que Luís Alexandre costumava alugar era um bimotor com capacidade para até 6 pessoas. Hoje, ida e volta para Angra dos Reis sai por cerca de R$ 6 mil e o auditor fiscal fazia pelo menos duas viagens por mês. Tudo pago com o dinheiro da fraude.
Fantástico – “Você tem uma lancha lá também?”
R – “Tenho!”
P – “Passeava também com as garotas na lancha?”
Luís Alexandre responde afirmativamente com um gesto de cabeça.
O modelo da lancha dele custa hoje, no mercado, R$ 500 milhões.
Fantástico – “Se fosse só o dinheiro do teu salário, você não gastaria isso?”
R – “Não! Nem dava para fazer isso. Você não gasta com isso o dinheiro fruto do seu sacrifício, né? Gastava porque entrava. Eu quis viver.”
P – “E viveu?”
R – “Vivi!”
Luís Alexandre conta que foi em uma dessas aventuras que conheceu Vanessa Alcântara, a ex-namorada que aparece em escutas telefônicas com o auditor, ameaçando denunciar o esquema. Eles têm um filho de nove meses.
Gravação: “Vou contar que tu contava dinheiro no tapete da minha sala. A gente contava R$ 200 mil. Lembra disso?”
Fantástico – “Como você conheceu a Vanessa?”
R – “Eu conheci em 2011, em uma casa frequentada por garota de programa.”
P – “Vocês contavam dinheiro assim no apartamento?"
R – “Eu nunca contei dinheiro com ela no tapete. Porque se eu contasse, ela pegaria pelo menos a metade.”
Vanessa diz que Luís Alexandre está mentindo. “Eu já cheguei a contar até R$ 400 mil. Mas existiam valores menores: R$ 40 mil, R$ 80 mil. Ele usou de: a Vanessa é esquizofrênica, bipolar, garota de programa, disso tudo, para tentar me denegrir.”
Luís Alexandre acusa Vanessa de usar o filho do casal para tirar dinheiro dele. Segundo o auditor, em uma escuta telefônica em poder do Ministério Público, Vanessa agride a criança.
Gravação: “Você não está preparado para ficar com ele. Escuta o tapão (som de criança chorando) Viu? Acabou de tomar um tapão! Quer teu filho? É teu filho.
Vanessa Alcântara negou a agressão ao filho. “Eu nao bati. Eu botava a chupeta, ele calava, eu tirava a chupeta e ele estava quase dormindo. Mas não foi um tapa”, afirmou.
Luís Alexandre conseguiu a guarda da criança na Justiça. Vanessa pode ver o menino uma vez por semana, só no fórum e na presença de uma assistente social.
Um vídeo obtido pela reportagem do Fantástico mostra o último encontro do casal, segunda-feira (18) passada. Nele, Vanessa aparece agredindo Luís Alexandre.
Gravação: “Como é que você vai sustentar o teu filho, Luís? Como você acha que vai sustentar ele?”.
Em seguida, ela acerta um soco na nuca dele. “Ele começou a dar risada de canto de boca para mim. Eu fui para cima dele, no impulso de mãe, muito nervosa e dei um tapa na cabeça dele. Pode passar o tempo que for, ele vai para cadeia, ele vai perder tudo”, disse Vanessa.
Hoje, Luís Alexandre mora com o filho e a nova namorada. O auditor pode ser condenado a 25 anos de cadeia.
Fantástico – “Você não se arrepende de ser um corrupto?”
R – “Essa pergunta, eu ainda não sei te responder. A ficha não caiu, né?”
P – “Quem é o Alexandre corrupto?”
R – “O Alexandre corrupto foi o que aceitou fazer parte dessa situação.”
P – “Se você tivesse condições de devolver esse dinheiro, você devolveria?”
R – “É, não dá para fazer isso, né? Como é que eu vou fazer?”
P – “Nem teria como?”
R – “Não teria como, só se eu bater na porta de um monte de moça por aí e tentar devolver e tal. Não tem como!”
Fonte: G1, com informações do Fantástico
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