Controle de horas, aplicativos de bloqueio e ferramentas de monitoramento. Com as crianças e adolescentes cada vez mais conectados, manter o controle dos pequenos e evitar o uso desregrado de internet e redes sociais passou a ser um desafio imenso para pais, mães e tutores. Apesar da responsabilidade e da necessidade do controle, defendida por psicólogos e educadores , os pais ainda têm dificuldades em limitar o acesso às telas dos filhos. Prova disso é uma pesquisa inédita feita pela TIC Kids Online, que aponta que apenas 3 em cada 10 usuários de Internet de 9 a 17 anos têm responsáveis que utilizam recursos para bloquear ou filtrar sites e aplicativos (32%).
Na casa de Raíssa Soriano, 35 anos, a realidade é diferente. Mãe de Paulinho, atualmente com 13 anos, ela vetou o acesso ao smartphone desde cedo, algo que só veio acontecer há pouco mais de um ano, mas com um controle rígido por parte dela e do esposo. A empresária explica que utiliza o aplicativo Google Family, que monitora o uso diário, aplicativos baixados e acessos no celular. “Eu e meu marido tivemos muito cuidado em dar celular para ele. Não queríamos até que ele fizesse 12 anos. Teve todo um acordo com ele. Na turma dele todo mundo já tinha. É difícil demais nadar contra a corrente”, cita.
“Tenho um app que dentro dele eu posso determinar quantas horas ele vai usar por dia e limitar também o uso de aplicativos. Por exemplo: TikTok não quero que ele use, então é bloqueado literalmente. Tem também a hora de dormir: o celular desbloqueia mais ou menos na hora que ele vai para a escola e bloqueia por volta das 22h para ele ter uma boa noite de sono”, explica Raíssa. Limitando o uso a cerca de 4h diárias, Paulinho de vez em quando é beneficiado com horas a mais, com bom comportamento e realização das atividades diárias e escolares. “Tudo depende do comportamento dele: ele vai melhorando, eu libero o Instagram, Youtube, com 2h diárias. Tento limitar mais as redes sociais”, acrescenta.
Segundo a psicóloga Flávia Alves da Silva, presidente do Conselho Regional de Psicologia do RN (CRP-RN), é importante que o uso de telas por parte das crianças seja monitorado e regrado por parte dos pais. “Sobre a conscientização desse público, crianças e adolescentes só fazem uso de telas porque os adultos permitem. Então se elas são apresentados muito cedo às telas, elas se acostumam com aquilo. É importante que o tempo para esse uso seja monitorado e seja reduzido, precisa ter um tempo limite. É importante que tenha supervisão para saber quais atividades aquela criança está realizando nas telas, se aquilo é perigoso, se tem retorno positivo para elas”, explica.
Para Débora Sampaio, mestre em psicologia da adolescência, especialista em dependência tecnológica e terapeuta de famílias, a chegada e disseminação dos smartphones na sociedade trata-se de uma “reconfiguração da infância e da adolescência” em função do uso exagerado de dispositivos eletrônicos.
“A infância do brincar passou a ser a infância do celular e os adolescentes estão apresentando vários vícios digitais (redes sociais, apostas online, porno-grafia e jogos). Crianças e adolescentes são vulneráveis e ainda estão em processo de desenvolvimento físico, emocional, social e o uso desmedido da internet e das redes sociais traz riscos e impactos em todas essas esferas”, avalia Débora Sampaio.
Entre os riscos, questões como distúrbios no sono, problemas de visão, sedentarismo, ansiedade, irritabilidade, isolamento social, solidão, angústia, dificuldade de foco e concentração e dependência são alguns dos perigos do uso desregrado. Além disso, o universo online apresenta ainda outros riscos como cyberbullying, conteúdos adultos, predadores sexuais, abuso e estupro virtual.
Monitoramento
Uma das alternativas indicadas pela psicóloga Débora Sampaio é a orientação dos pais por parte dos filhos. Ela cita que os pais são uma “geração analógica educando uma geração digital”, o que reforça a importância do uso consciente.
“Muitos de nós precisamos entregar o eletrônico para nossos filhos na pandemia para que pudessem assistir aula, conversar com amigos e familiares e fizemos isso sem nenhum tipo de orientação. Nesse momento precisamos urgentemente dialogar com eles sobre isso. Os pais precisam buscar informações para que possam orientar os filhos”, aponta.
Entre as alternativas indicadas por psicólogos e educadores estão o estabelecimento de horários e rotinas para o uso das telas, jogos em casa, atividades ao ar livre, prática de esportes e ajuda na rotina das atividades da casa. “O mais importante: fortalecer a conexão afetiva, demonstrar interesse genuíno pelo que os filhos acessam, participam, promover momentos em família sem telas e ser exemplo”, explica.
Pesquisa traz números preocupantes para famílias
Lançada nesta semana, a nova edição da TIC Kids Online Brasil mostra que cerca de 3 em cada 10 usuários de Internet de 9 a 17 anos têm responsáveis que utilizam recursos para bloquear ou filtrar alguns tipos de sites (34%), para filtrar que aplicativos podem ser baixados (32%), que limitam as pessoas com as quais crianças e adolescentes podem entrar em contato por meio de chamadas de voz ou mensagens (32%), que monitoram sites ou aplicativos acessados (31%), que bloqueiam anúncios (28%), que alertam sobre o desejo de fazer compras em aplicativos (26% ), e que restringem o tempo na Internet (24%).
“É um número muito preocupante tendo em vista que crianças e adolescentes nessa faixa etária não têm maturidade para ter contato com estranhos ou pessoas que mentem sobre idade, podem facilmente ser vítimas de grooming (pessoas que fazem amizade com crianças para tirar vantagem delas para abuso sexual e outras formas de abuso infantil)”, avalia Débora Sampaio, mestre em psicologia da adolescência, especialista em dependência tecnológica e terapeuta de famílias.
A pesquisa identificou ainda que 61% dos responsáveis de usuários de 9 a 17 anos afirmaram “sempre” ou “quase sempre” olhar o celular para ver o que a criança ou adolescente está fazendo, ou com quem está falando (proporção é de 80% no caso de usuários com idades de 9 a 10 anos e de 40% para usuários de 15 a 17 anos); 51% determinam regras para a utilização do dispositivo (71% para os de 9 a 10 anos e 27% para os de 15 a 17 anos), e 30% suspendem a utilização do celular pelos filhos por algum tempo (45% para os de 9 a 10 anos e 15% entre 15 e 17 anos).
Responsáveis de 83% dos usuários de 9 a 10 anos declararam que “sempre” ou “quase sempre” ensinam jeitos de a criança usar a Internet com segurança, e 86% disseram conversar sobre o que ela faz online (as porcentagens foram de 63% e de 55%, respectivamente, para os adolescentes de 15 a 17 anos).
A pesquisa foi realizada pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), departamento do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), que coletou pela primeira vez dados sobre a frequência de uso das plataformas digitais pela população analisada.
Tribuna do Norte
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