Michel Temer critica sanções de Trump ao Brasil: "Inadmissível"

 


Michel Temer, que nos últimos anos tem atuado como uma espécie de conselheiro de  Jair Bolsonaro e servido como uma ponte entre a extrema direita e o centrão, resolveu vir a público para se manifestar contra as tarifas de 50% impostas pelo governo dos Estados Unidos aos produtos brasileiros e à cassação dos vistos de entrada nos EUA de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), por ordem do presidente Donald Trump.

Nesta quarta-feira (23), Temer divulgou nas redes sociais um vídeo em que prega "diálogo" para superar o momento de "turbulência", tecendo críticas às sanções de Trump ao Brasil – que vieram após articulações de Jair Bolsonaro e seu filho, o deputado licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), para coagir o judiciário e o governo brasileiro e interromper o inquérito da tentativa de golpe de Estado que deve levar o ex-presidente e seus aliados à prisão.

Sem citar diretamente o nome de Bolsonaro ou mesmo o do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Temer defendeu que a solução para a crise com os EUA deve vir a partir de um diálogo a ser travado pelo governo federal, em uma crítica clara às articulações golpistas de Eduardo Bolsonaro.

"É hora de procurar abrigo no porto seguro do diálogo (...) Digo isso profundamente entristecido com a taxação despropositada imposta aos nossos produtos e pela lamentável eliminação de vistos dos ministros da Suprema Corte, o que é injustificável e inadmissível. São inadequações que não se resolvem, contudo, com bravatas, com ameaças, com retruques, com agressões. Resolve-se pelo diálogo que se faz entre nações, especialmente nações parceiras. E o diálogo se faz pelos mais variados meios, pela diplomacia tradicional, pelo contato dos legislativos e, naturalmente, pela interlocução entre os chefes dos respectivos governos", disse Temer.

Responsável por indicar o ministro Alexandre de Moraes ao STF, Temer, a exemplo do que fez quando mandou Bolsonaro baixar o tom em suas investidas contra a Corte, ainda pediu pacificação para que a situação não se transforme em uma "briga de rua".

"O bom senso e o cálculo estratégico devem prevalecer, sem jamais partir para um confronto que transforme a situação em uma espécie de briga de rua, de brasileiros contra brasileiros, de país contra país. Devemos agir e reagir como uma nação livre e soberana que somos, sem excessos de ambas as partes e sempre rigorosamente guiados pelos tratados internacionais e pela nossa Constituição. É o meu desejo", finalizou. (Assista vídeo aqui)

Veja vídeo:

Conselheiro de Bolsonaro e desembarque do centrão

A fala de Michel Temer não surpreende. O emedebista já vinha atuando nos bastidores para conter os danos causados pelas investidas golpistas de Jair Bolsonaro. Em junho, dias antes do interrogatório de Bolsonaro no STF no âmbito da ação penal sobre a tentativa de golpe de Estado, Temer foi procurado pelo ex-presidente para aconselhamento político. O resultado foi mais uma cena pública de submissão: obedecendo ao roteiro ditado por TemerBolsonaro pediu desculpas a Alexandre de Moraes e tentou aparentar serenidade diante da Corte.

Temer teria repreendido Bolsonaro com firmeza. Disse que ele era "muito agressivo em suas falas" e que deveria ser "humilde". Também criticou abertamente as atitudes de Eduardo Bolsonaro nos EUA, afirmando que ataques ao STF não ajudavam em nada. O ex-presidente, então, seguiu à risca as ordens recebidas e, durante o interrogatório, admitiu não ter indícios sobre as acusações feitas contra ministros da Corte, pediu desculpas e tentou, sem sucesso, fazer piadas com Moraes.

Anos antes, em 7 de setembro de 2021, Bolsonaro fez ameaças ao STF chamou Moraes de "canalha", afirmando que não cumpriria determinações judiciais do ministro. No dia seguinte, o ex-presidente foi convocado pelo Planalto e voou de São Paulo para Brasília no dia 9, com a finalidade de apaziguar os ânimos. Temer foi responsável pela redação de um texto, intitulado "Carta à nação", assinado e divulgado por Jair Bolsonaro.

"Quero declarar que minhas palavras, por vezes contundentes, decorreram do calor do momento e dos embates que sempre visaram o bem comum", dizia a carta, divulgada dois dias depois da declaração no evento. Temer também viabilizou uma ligação telefônica entre Moraes e o então presidente, para uma conversa relatada como curta e protocolar.

A sequência de gestos de submissão e constrangimento não apenas revoltou a base bolsonarista como aprofundou a sensação de isolamento de Bolsonaro no campo da direita. Cada vez mais escanteado pelas figuras do centrão, o ex-presidente virou um estorvo político. Partidos como MDB, União Brasil e até parte do PL já articulam uma alternativa eleitoral que exclua o clã Bolsonaro da cabeça de chapa em 2026.

Nesse cenário, a fala pública de Temer criticando Trump e cobrando “diálogo” expõe o reposicionamento do centrão, que agora busca reconstruir pontes com o Judiciário e a comunidade internacional. As declarações também fortalecem a articulação de uma candidatura conservadora “higienizada”, que preserve pautas da direita econômica sem o peso do golpismo, que seria representada pelo governador de São Paulo Tarcísio de Freitas (Republicanos). 

Enquanto isso, Bolsonaro, acossado por investigações e sem poder real de articulação, torna-se cada vez mais uma figura decorativa e, para o centrão, descartável.

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