Por: Marcelino Galo
A obsolescência programada nasceu na década de 1920, com a criação de
um cartel mundial na venda de lâmpadas elétricas. Uma de suas metas,
alcançada rapidamente, foi a diminuição da vida útil do produto de 2500
horas para 1000 horas. Os membros do cartel que não reduzissem a vida
útil de suas lâmpadas no tempo estabelecido pagavam uma multa. A
indústria passou a programar a duração de seus produtos. Esse e outros
casos podem ser vistos no filme Comprar, tirar, comprar, documentário espanhol da diretora Cosima Dannoritzer, que conta a história da obsolescência programada.
A ideia fez rodar com mais velocidade os motores da indústria e
impulsionou a acumulação de capital das grandes corporações mundiais.
Entretanto, quase 100 anos depois, esse debate vem novamente à tona.
Com o avanço da agenda ambiental a crítica ao modo de produção
capitalista ganha um novo impulso. A busca por um modo de produção e
consumo ambientalmente sustentável, um paradoxo diante da lógica
capitalista de acumulação predatória, teve um novo impulso com as ideias
de Georgescu Roegen.
O economista romeno introduziu as leis da termodinâmica na economia.
Com isso, colocou os recursos naturais no centro do ciclo econômico.
Para Georgescu, a economia não dava aos processos exossomáticos do homem
a devida importância. O ser humano usa a energia de fora de seus corpos
como nenhum outro animal. A Era dos combustíveis fósseis aprofundou
essa transferência energética e, com isso, aumentou substancialmente a
produção dos resíduos e a diminuição dos recursos naturais.
Os estudos de Georgescu apontavam para uma inevitável estabilização
das atividades econômicas. O uso de fontes de energia de alta entropia,
como a luz solar, e a racionalização no uso dos recursos naturais eram
medidas indispensáveis para a sobrevivência da espécie humana. Roegen,
com inquestionável coragem intelectual, defendeu então que os produtos
teriam que durar mais tempo. Coube a Andrei Cechin difundir no Brasil as
ideias do economista romeno, com a obra A natureza como limite da economia: a contribuição de Nicholas Georgescu-Roegen.
A lição aqui colocada é que o modo de produção e os padrões de
consumo determinarão a possibilidade ou não de vida para as gerações
futuras. A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e
Desenvolvimento, de 22 de dezembro de 1989, estabeleceu entre suas
diretrizes: (a) Promover padrões de consumo e produção que reduzam as
pressões ambientais e atendam às necessidades básicas da humanidade; (b)
Desenvolver uma melhor compreensão do papel do consumo e da forma de se
implementar padrões de consumo mais sustentáveis.
No Brasil, entre as prioridades estabelecidas pela Política Nacional
de Resíduos Sólidos estão a não geração de resíduos e a redução na
fonte. Essas premissas orientarão os planos municipais de resíduos
sólidos. Portanto, união, estados e prefeituras passam a serem obrigados
a efetivá-las.
Na Bahia, a recém aprovada Política Estadual de Resíduos Sólidos,
projeto de que fui o Relator, estabelece entre os seus objetivos a
“adoção de padrões e práticas sustentáveis de produção e consumo de bens
e serviços”. Para tanto, é preciso discutir a obsolescência programada.
Somente o Estado pode fazer prevalecer o interesse público, diante da
força do mercado e o interesse privado. E é preciso que os parlamentos
estaduais normatizem as medidas que estimulem a adoção de padrões de
produção e consumo sustentáveis.
Por isso, apresentei na Assembleia Legislativa da Bahia o PL
20.663/2013, que cria o Programa Estadual de Combate a Obsolescência de
Produtos. A iniciativa baseia-se em proposição similar apresentada na
Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo pelo deputado Rui Falcão
(PT/SP). O que se pretende é que os produtos comercializados no Estado
da Bahia contenham em suas embalagens, de forma expressa e legível, sob
pena de multa, informações sobre o ciclo de vida do produto,
discriminando obrigatoriamente um prazo mínimo de sua utilidade.
A obsolescência programada, além de um desrespeito ao consumidor, é
uma expropriação dos recursos naturais do planeta. A grande pergunta é: o
que nós da sociedade civil, do parlamento, dos movimentos populares,
faremos diante disso?
Por: Marcelino Galo é engenheiro agrônomo, deputado estadual (PT/BA) e presidente da Frente Parlamentar Ambientalista da Bahia.Via: Viomundo.com.br
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