Os produtos que compramos são feitos para cabar logo

Qual a vida útil do produto que você acabou de comprar? Por que os produtos duram cada vez menos tempo? Você já comprou um ferro de passar roupa com um selo em que se pode ler “Duração mínima: 5 anos”? Improvável. Todavia, sem essas informações, o cidadão não pode escolher um produto levando em conta a vida útil dele.
 Por: Marcelino Galo
A obsolescência programada nasceu na década de 1920, com a criação de um cartel mundial na venda de lâmpadas elétricas. Uma de suas metas, alcançada rapidamente, foi a diminuição da vida útil do produto de 2500 horas para 1000 horas. Os membros do cartel que não reduzissem a vida útil de suas lâmpadas no tempo estabelecido pagavam uma multa. A indústria passou a programar a duração de seus produtos. Esse e outros casos podem ser vistos no filme Comprar, tirar, comprar, documentário espanhol da diretora Cosima Dannoritzer, que conta a história da obsolescência programada.

A ideia fez rodar com mais velocidade os motores da indústria e impulsionou a acumulação de capital das grandes corporações mundiais. Entretanto, quase 100 anos depois, esse debate vem novamente à tona.


Com o avanço da agenda ambiental a crítica ao modo de produção capitalista ganha um novo impulso. A busca por um modo de produção e consumo ambientalmente sustentável, um paradoxo diante da lógica capitalista de acumulação predatória, teve um novo impulso com as ideias de Georgescu Roegen.

O economista romeno introduziu as leis da termodinâmica na economia. Com isso, colocou os recursos naturais no centro do ciclo econômico. Para Georgescu, a economia não dava aos processos exossomáticos do homem a devida importância. O ser humano usa a energia de fora de seus corpos como nenhum outro animal. A Era dos combustíveis fósseis aprofundou essa transferência energética e, com isso, aumentou substancialmente a produção dos resíduos e a diminuição dos recursos naturais.

Os estudos de Georgescu apontavam para uma inevitável estabilização das atividades econômicas. O uso de fontes de energia de alta entropia, como a luz solar, e a racionalização no uso dos recursos naturais eram medidas indispensáveis para a sobrevivência da espécie humana. Roegen, com inquestionável coragem intelectual, defendeu então que os produtos teriam que durar mais tempo. Coube a Andrei Cechin difundir no Brasil as ideias do economista romeno, com a obra A natureza como limite da economia: a contribuição de Nicholas Georgescu-Roegen.

A lição aqui colocada é que o modo de produção e os padrões de consumo determinarão a possibilidade ou não de vida para as gerações futuras. A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, de 22 de dezembro de 1989, estabeleceu entre suas diretrizes: (a) Promover padrões de consumo e produção que reduzam as pressões ambientais e atendam às necessidades básicas da humanidade; (b) Desenvolver uma melhor compreensão do papel do consumo e da forma de se implementar padrões de consumo mais sustentáveis.

No Brasil, entre as prioridades estabelecidas pela Política Nacional de Resíduos Sólidos estão a não geração de resíduos e a redução na fonte. Essas premissas orientarão os planos municipais de resíduos sólidos. Portanto, união, estados e prefeituras passam a serem obrigados a efetivá-las.

Na Bahia, a recém aprovada Política Estadual de Resíduos Sólidos, projeto de que fui o Relator, estabelece entre os seus objetivos a “adoção de padrões e práticas sustentáveis de produção e consumo de bens e serviços”. Para tanto, é preciso discutir a obsolescência programada.

Somente o Estado pode fazer prevalecer o interesse público, diante da força do mercado e o interesse privado. E é preciso que os parlamentos estaduais normatizem as medidas que estimulem a adoção de padrões de produção e consumo sustentáveis.

Por isso, apresentei na Assembleia Legislativa da Bahia o PL 20.663/2013, que cria o Programa Estadual de Combate a Obsolescência de Produtos. A iniciativa baseia-se em proposição similar apresentada na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo pelo deputado Rui Falcão (PT/SP). O que se pretende é que os produtos comercializados no Estado da Bahia contenham em suas embalagens, de forma expressa e legível, sob pena de multa, informações sobre o ciclo de vida do produto, discriminando obrigatoriamente um prazo mínimo de sua utilidade.

A obsolescência programada, além de um desrespeito ao consumidor, é uma expropriação dos recursos naturais do planeta. A grande pergunta é: o que nós da sociedade civil, do parlamento, dos movimentos populares, faremos diante disso?

Por: Marcelino Galo é engenheiro agrônomo, deputado estadual (PT/BA) e presidente da Frente Parlamentar Ambientalista da Bahia.Via: Viomundo.com.br

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