No último dia 20 de abril, o Supremo
Tribunal Federal (STF) iniciou o julgamento da Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADI) 5090. A ação questiona a constitucionalidade
de dispositivos legais que estabelecem critérios de correção monetária
dos depósitos nas contas vinculadas ao Fundo de Garantia por Tempo de
Serviço (FGTS).
Atualmente, o saldo dessas contas é
corrigido com juros de 3%, acrescido da Taxa Referencial (TR). Como esse
modelo de correção se mantém sistemática e consideravelmente abaixo da
inflação, os recursos do trabalhador em sua conta de FGTS perdem poder
de compra com o passar do tempo.
Todos os processos que versam sobre
essa matéria estão suspensos, aguardando o entendimento que será adotado
pelo Supremo Tribunal Federal.
A discussão havia sido encerrada
pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), em sede de incidente de recurso
repetitivo, com decisão desfavorável ao trabalhador. Na ocasião, o STJ
entendeu que o Poder Judiciário não pode alterar a aplicação da Taxa
Referencial (TR) e considerou que caberia somente ao Congresso Nacional
determinar outro índice de correção monetária.
Contudo, a partir da declaração de
inconstitucionalidade da aplicação da Taxa Referencial (TR), a discussão
sobre a correção do FGTS foi retomada pelo Supremo Tribunal Federal em
2019.
Hoje, há aproximadamente 117 milhões de contas ativas ou inativas, de cerca de 70 milhões de trabalhadores.
O ministro Luís Roberto Barroso,
relator da ação, reconheceu que os critérios de correção monetária
estabelecidos nos dispositivos impugnados são insuficientes e geram
perda de poder de compra para o trabalhador. A solução encontrada pelo
ministro relator foi a de julgar parcialmente procedente o pedido e
aplicar uma “interpretação conforme a Constituição”, a fim de declarar
que a remuneração das contas do FGTS não pode ser inferior à da
caderneta de poupança.
Todavia, o ministro Barroso propôs
que a decisão somente produza efeitos para o futuro, de forma que os
saldos existentes não sejam ajustados. Segundo ele, a ocorrência de
perdas passadas somente poderá ser avaliada e equacionada pela via
legislativa ou mediante negociação entre entidades de trabalhadores e o
Poder Executivo.
Antes da suspensão do julgamento, o
ministro André Mendonça chegou a proferir seu voto, em linha com o
relator. O julgamento deverá ser retomado na próxima quinta-feira
(27). Na hipótese de prevalecer o voto do relator, estaremos diante de
uma situação paradoxal. De um lado, os recursos do trabalhador foram
corroídos pelos efeitos da inflação com base em lei cuja interpretação
foi declarada inconstitucional. De outro, o STF condenará a vítima (no
caso, o trabalhador) a suportar o ônus da legislação inconstitucional.
Ao Estado brasileiro, que por
décadas se apropriou ilicitamente desses recursos, corresponderá apenas
aplicar, da data do julgamento em diante, correção não inferior à da
caderneta de poupança.
Portanto,
confiamos que a maioria dos membros do STF estará sensível a essa
incongruência e, principalmente, às perdas efetivamente sofridas pelo
trabalhador ao longo de mais de duas décadas, e decidirá não apenas pela
“interpretação conforme” mas, sobretudo, pelos efeitos dessa
interpretação conforme, de forma que a ordem constitucional seja
restabelecida desde o momento em que passou a ser violada.
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