Em entrevista ao programa Boa Noite 247, o advogado e cientista político Jorge Folena fez uma análise contundente sobre a crise de governabilidade no Brasil, relacionando-a ao avanço do semipresidencialismo informal e ao uso indiscriminado das emendas parlamentares. Segundo Folena, a classe dominante brasileira busca enfraquecer o poder do Executivo para manter o controle do país por meio do Parlamento.
“A classe dominante não consegue ganhar eleições para o Executivo e, provavelmente, perderá também em 2026. Então, qual é a forma de controle? Por meio do Parlamento”, afirmou o especialista. Para ele, essa estratégia se desenrola desde o segundo governo Dilma Rousseff, quando foi criado o orçamento impositivo, que reduziu a autonomia do Executivo sobre a destinação de verbas. “Isso era um sonho dos parlamentares, e foi imposto a partir de 2015, quando o governo da presidenta Dilma começou a se fragilizar.”
Folena destacou que essa fragilidade foi aprofundada no governo Michel Temer e solidificada sob Jair Bolsonaro, período em que o Congresso reforçou sua influência sobre o orçamento público. “Hoje, no Brasil, eu não tenho a menor dúvida: vivemos uma crise de governabilidade e um semipresidencialismo informal sendo formalizado aos poucos”, alertou.
O advogado argumentou que esse modelo favorece a corrupção e impede que o país seja governado de maneira eficiente. Como exemplo, citou as recentes denúncias contra deputados que desviaram verbas de emendas parlamentares para prefeituras, cobrando contrapartidas dos gestores locais. “Nós estamos diante de casos de polícia, crimes graves. Esse dinheiro deveria ir para escolas, hospitais e merenda das crianças, mas está sendo utilizado para barganhas políticas nos grotões do país.”
Outro ponto abordado por Folena foi a independência do Banco Central, aprovada no governo Bolsonaro, como um dos mecanismos que retiraram poder do Executivo. “A grande questão do Banco Central independente é que o governo eleito não pode mais definir a política econômica do país. Isso está acontecendo agora com o presidente Lula, que tem um compromisso com a soberania nacional e o desenvolvimento, mas está amarrado por essas medidas.”
Folena também fez duras críticas ao Supremo Tribunal Federal (STF), que, segundo ele, evita enfrentar a inconstitucionalidade dessas mudanças. “O Supremo sabe que essas emendas impositivas são inconstitucionais porque enfraquecem um poder em benefício de outro, quebrando o princípio da separação de poderes. Mas, em vez de declarar isso, prefere discutir apenas transparência. Isso é muito pouco.”
O cientista político vê a tentativa de implementação formal do semipresidencialismo como um processo gradual, conduzido de forma sutil para não causar grandes resistências. “Vão colocando o tema em debate, fazem eventos no exterior com ministros do STF participando, promovem comissões na Câmara para discutir a mudança, como já aconteceu sob Arthur Lira. Isso vai sendo sedimentado até que se torne um fato consumado.”
Por fim, Folena lamentou a ausência de um ambiente democrático pleno no Brasil e a falta de compromisso da elite econômica com o país. “Não há normalidade democrática desde muito antes do golpe de 2016. A classe dominante não gosta do povo brasileiro e não tem compromisso com a soberania nacional. Querem transformar o presidente da República em mero chefe de Estado, enquanto o governo fica nas mãos do Congresso e do mercado financeiro.”
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