Por: Anna Amélia M. Franco
As
favelas na cidade do Rio de Janeiro começaram a ter início no final do século
XIX, quando várias transformações sócio-econômicas pelas quais o Brasil passava
e transformações locais começaram a inchar a área central da cidade, formando
os primeiros cortiços. Acredita-se que a primeira favela carioca tenha surgido
em 1897 no antigo Morro de Santo Antônio, no entanto a favela mais antiga do
país situa-se no Morro da Providência, onde alguns soldados provenientes da
Guerra de Canudos começaram a morar.
Segundo
dados oficiais do Censo de 2010, coletados pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), cerca de dois nonos ou 22% da população da
cidade do Rio de Janeiro mora em favelas, sendo a capital fluminense o
município com com o maior número de moradores favelados do Brasil, 1.393.314
habitantes. Em sua região metropolitana, 1.702.073 de pessoas moram em
“assentamentos subnormais”, a definição do governo para classificar as favelas,
o que corresponde a 14,4% da população da metrópole.
As
favelas cariocas possuem aspectos que as diferenciam das do resto do Brasil,
com as de São Paulo. No Rio de Janeiro, esse tipo de assentamento urbano é mais
populoso, predominando favelas com mais de mil domicílios, além do surgimento
dos chamados “complexos de favelas”, que são aglomerados de vários
assentamentos subnormais próximos que acabaram por se conurbar, um fenômeno
mais raro no restante do país. Outra característica das favelas cariocas é a
sua proximidade de áreas nobres e centrais, o que cria um forte contraste
social.
Em
meados do século XIX, transformações sociais desencadeadas por fenômenos como a
decadência da produção cafeeira no Vale do Paraíba, a abolição da escravidão e
o início desenvolvimento do processo industrial no país, trouxeram muitos
ex-escravos e europeus, especialmente portugueses, para a então capital do
Brasil. O grande crescimento demográfico da cidade inchou sua área central, que
tradicionalmente concentrava vários cortiços. O então prefeito da cidade,
Cândido Barata Ribeiro, iniciou a perseguição a esse tipo de moradia, o que
culminou, em 1893, na demolição do cortiço “Cabeça de Porco”. Todo o processo
de despejo desalojou cerca de 2 mil pessoas e um grupo de ex-moradores do
cortiço conseguiu permissão para construir suas casas no Morro da Providência.
Outro grupo de soldados que lutaram contra a Revolta da Armada recebeu
permissão para construir moradias sobre o Morro de Santo Antônio, dando início
aos primeiros aglomerados que mais tarde seriam chamados de “favelas”.
Em
1897, cerca de 20 mil soldados que haviam retornado ao Rio de Janeiro após a
Guerra de Canudos, na província oriental da Bahia, começaram a morar no já
habitado Morro da Providência. Durante o conflito, a tropa governista havia se
alojado na região próxima a um morro chamado “Favela”, o nome de uma planta
resistente da família Euphorbiaceae, que causava irritação quando
entrava em contato com a pele humana e que era comum na região. A planta era da
espécieCnidoscolus quercifolius, chamada de árvore “faveleira”. Por ter
abrigado pessoas que haviam lutado naquele conflito, o Morro da Providência
recebeu o apelido de “Morro da Favela”. O nome tornou-se popular e, a partir da
década de 1920, os morros cobertos por barracos e casebres passaram a ser
chamados de favelas.
No
início do século XX, essas construções irregulares recém-formadas, assim como
os antigos cortiços, eram vistas pela maior parte da população carioca como o
lar da criminalidade e de doenças. No entanto, como a capital da República do
Brasil, que tinha sido recentemente proclamada, o Rio de Janeiro precisava
passar por reformas para se tornar uma cidade mais europeia e moderna para os
padrões da época. Foi então que o prefeito Francisco Pereira Passos passou a
realizar amplas reformulações urbanas no centro da cidade, o que incluía a
ampliação e a abertura de novas vias, como a Avenida Central. Durante as
reformas, vários cortiços foram demolidos e seus moradores obrigados a procurar
outras formas de viver no cada vez mais valorizado centro, entre as quais
estavam ocupar os morros próximos, o que forçou uma forte expansão das favelas
no período. No entanto, os moradores desses assentamentos só passariam a ser
reconhecidos pela sociedade e pelo poder público a partir dos anos 1920.
Desde
então, começando na era do Estado Novo, sob o governo de Getúlio Vargas,
passando pelo governo de Carlos Lacerda na Guanabara, até o Regime Militar nos
anos 1960, vários programas de remoção e eliminação de favelas despejaram e
desalojaram milhares de pessoas e destruíram vários barracos, sem obter
qualquer sucesso na resolução do problema. Estima-se que no período
compreendido entre os anos de 1962 e 1974, 80 favelas foram envolvidas nesses
programas, resultando em 26.193 barracos destruídos e 139.218 habitantes
removidos. No período da ditadura militar, alguns líderes das comunidades de
favelas chegaram a ser torturados e mortos.
No
final dos anos 1970 e início dos anos 1980, o inchaço populacional, a ausência
do Estado e a consequente falta de políticas públicas, tornaram as favelas os
principais centros do narcotráfico no Rio de Janeiro, o que tornou essas áreas
ainda mais violentas.
Foi
apenas na década de 1990, quando esses assentamentos já estavam consolidados e
as suas populações já eram enormes, que o governo municipal passou a buscar
maneiras deurbanizar as favelas da cidade, ao invés de simplesmente
derrubá-las. Nesse período, programas como o Favela-Bairro começaram a trazer
algum tipo de infraestrutura à essas áreas, como água encanada, saneamento
básico, coleta de lixo, iluminação pública, etc. Em 2008, a Secretaria de
Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro passou a implantar o projeto da
Unidade de Polícia Pacificadora (UPP), que consiste em implantar unidades
policiais comunitárias em favelas dominadas pelo tráfico de drogas, retomando o
controle do território para o Estado. Atualmente, o projeto beneficia cerca de
280 mil pessoas na cidade. Entretanto, denúncias de abuso de autoridade têm
sido feitas contra alguns policiais militares que atuam nessas unidades.
0 Comentários