A França iniciou
no dia 11 de janeiro uma intervenção militar em Mali, na África,
para deter o avanço de rebeldes islâmicos, que já controlam parte do país
africano. Mali é uma antiga colônia francesa e um dos países mais pobres do
mundo, com metade da população de 12 milhões de habitantes vivendo abaixo da
linha de pobreza.
Por: José Renato Salatiel
Em março do ano
passado, grupos ligados à rede terrorista Al
Qaeda iniciaram um levante, após um golpe de Estado que derrubou o governo
local. Eles conquistaram a região norte do país, localizada no meio do deserto
do Saara, e ameaçavam chegar à capital, Bamako.
O governo do
socialista François
Hollande justificou a operação com o risco de Mali se tornar um foco de
grupos terroristas, como o Afeganistão, nação asiática ocupada há 11 anos pelos
Estados Unidos.
A França mantém
relações comerciais na região e, atualmente, possui oito cidadãos reféns dos
insurgentes de Mali. A Europa teme ataques terroristas em represália à invasão
francesa. Já a ONU estima que 4,2 milhões de malianos imigrarão por causa
dos combates e, desta forma, precisarão de ajuda humanitária.
O roteiro da
guerra civil em Mali é o mesmo de todos os conflitos na África nas últimas
décadas: um país pobre sofre um golpe militar, que resulta em lutas sangrentas
e população massacrada pela fome. O único elemento novo nessa trama é a atuação
de radicais islâmicos, que assumiram o lugar das guerrilhas comunistas nos
tempos da Guerra
Fria.
A África é o
segundo maior e mais populoso continente do mundo. É também o continente com
maior número de conflitos duradouros em todo o planeta, de acordo com a ONU. De
um total de 54 países que compõem a África, 24 encontram-se atualmente em
guerra civil ou em conflitos armados, de acordo com um levantamento do site
Wars in the World.
As batalhas mais
devastadoras ocorrem, hoje, em Ruanda, Somália, Mali, República
Centro-africana, Darfur, Congo, Líbia, Nigéria, Somalilândia e Puntlândia
(Estados declarados independentes da Somália em, respectivamente, 1991 e 1998).
Esses combates envolvem 111 milícias, guerrilhas, grupos separatistas ou
facções criminosas.
Os países em
guerra ficam na chamada África Subsaariana, que compreende os territórios que
não fazem parte da África do Norte e do Oriente Médio. A região é caracterizada
pela pobreza, instabilidade política, economia precária, epidemias, baixos
indicativos sociais e constantes embates entre governos e rebeldes.
São disputas que,
neste século 21, carecem de contornos ideológicos ou claras motivações sociais
e políticas. Distinguem-se, portanto, do movimento popular da Primavera Árabe.
Genocídios
No final da Segunda
Guerra Mundial (1939-1945), movimentos nacionalistas e anticolonialistas
travaram guerras para conquistar a independência das nações africanas. Nos anos
1970 e 1980, sucessivos golpes militares e disputas étnicas impediram a
continuidade política e, consequentemente, o desenvolvimento da região.
De modo geral, as
guerras africanas não são guerras entre países, mas conflitos internos. Eles
têm como principais causas a falência do Estado, batalhas pelo controle do
governo e a luta por autonomia de grupos étnicos.
O que mais chama
atenção, contudo, é a brutalidade dessas disputas, sobretudo aquelas travadas
após os anos 1990. Genocídios, massacres, estupros em massa, exército de
crianças e extermínio de comunidades inteiras com facões e machados compõem a
barbárie. A fome é outro instrumento usado pelas facções, que destroem as
plantações e expulsam populações de seus lares.
Diferente das
guerras no século 20, os atuais conflitos africanos matam, em 90% dos casos,
civis, não militares.
A Segunda Guerra
do Congo é considerada o conflito armado mais letal desde a Segunda Guerra
Mundial. Em 2008, 5,4 milhões de pessoas foram mortas, a maioria de fome.
Ruanda foi palco de um dos maiores genocídios da história do continente. Em
apenas cem dias, entre os meses de abril e junho de 1994, 800 mil pessoas foram
mortas no país, a maioria da etnia tutsi.
Em Darfur, desde
2003 os conflitos deixaram cerca de 400 mil mortos, segundo estimativas de
ONGs, e 2,7 milhões de refugiados, gerando uma das piores crises humanitárias
deste século.
Refugiados
Outra consequência
dos conflitos é a expulsão de milhares de pessoas para campos de refugiados.
Isso provoca, por sua vez, uma crise humanitária, com a proliferação de doenças
e a fome que dizimam a população.
O Alto
Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (UNHCR, na sigla em inglês)
calcula em 43,3 milhões o número de pessoas expulsas de seus países, em todo o
mundo, sendo que 15,2 milhões delas têm o status de refugiados. Afeganistão e
Iraque, países ocupados pelas forças americanas no começo deste século, possuem
o maior número de refugiados, seguidos de Somália e Congo. O maior campo de
refugiados no mundo fica no Quênia, com 292 mil pessoas.
Mesmo com a ajuda
humanitária, os países em guerra não conseguem se reconstruir. Ao final dos
combates, a pouca infraestrutura existente e serviços foram devastados,
atrasando ainda mais o progresso econômico. Teme-se que a guerra em Mali
componha a mesma narrativa.
Por:
José Renato Salatiel
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