A falta de organização faz parte da nossa cultura? Infelizmente parece que sim. Por: Laerce de Paula Nunes
Há no Brasil uma desorganização social estarrecedora que remonta ao
nosso descobrimento, todos olhando para o curto prazo e executando ações
desconexas e desorganizadas.
É impressionante a nossa dificuldade em organizar coisas
relativamente simples, parece fazer parte da nossa cultura a
improvisação e a desordem, nós preferimos não antecipar aos
acontecimentos e sim deixar que eles simplesmente ocorram.
O pior de tudo que ainda nos vangloriamos desta situação achando que
assim que é bom, que somos criativos e “espertos” na verdade somos é
mesmo desorganizado.
Esta desorganização é com toda certeza cultural, pois nos acostumamos
a esta situação, a prova mais cabal disto é que empresas estrangeiras
que prestam excelentes serviços nos países desenvolvidos ao se
instalarem aqui logo incorporam este modo de sermos, passam então a
prestar péssimos serviços, caros e de forma tão desorganizadas quanto as
nossas próprias.
A nossa desordem é tamanha que mesmo as boas ideias, são aqui no
Brasil logo desvirtuadas, como, por exemplo, criar facilidade para
idosos, portadores de necessidades especiais, etc. Estas ideias são
profundamente mal aplicadas e desta forma estas pessoas não desfrutam da
facilidade que é seu direito. Exemplificando de forma mais clara,
algumas lojas e bancos destinam caixas para atendimento prioritário,
porém colocam neste serviço funcionários inexperientes que tornam o
atendimento mais lento e mais complexo que os caixas convencionais.
A nossa indisciplina também é enorme, por exemplo, uma das maiores
dificuldades que se encontra na execução de tarefas industriais, bem
como em relação aos condutores de motocicletas é garantir que as pessoas
usem os equipamentos de proteção individual.
Para ilustrar que a nossa desorganização é cultural quando se vai ao
exterior, nos países desenvolvidos, todos gostam de ver como são
organizados, mas ao voltar para cá nos deparamos com a realidade e
achamos que é bom viver assim de forma desorganizada e, por conseguinte,
não conseguimos transplantar para o nosso meio o nível de organização
que vimos por lá.
Imaginemos se alguém nos questionasse sobre:
•O planejamento do país nos campos da saúde, educação, desenvolvimento industrial, etc.;
•O planejamento do nosso estado nas diversas áreas de competência estadual;
•O planejamento da nossa cidade nas diversas áreas que lhe compete.
A resposta certamente mais adequada éque damos pouca atenção ao
planejamento, são esparsas entre nós as ações de planejamento, talvez a
melhor resposta mesmo fosse a de que nós não planejamos, fazemos tudo de
improviso e é por isso que vivenciamos este caos diário em nossas
vidas. Nossas ações são quase sempre parametradas por acontecimentos de
mau desempenho ou tragédias, dificilmente por um conjunto de ações
preventivas baseadas em planejamento.
Nós, em geral, trabalhamos somente em cima de fatos consumados,
somente os acidentes e as tragédias provocam mudanças de atitudes.
Perdemos milhões e milhões em retrabalhos, por fata de planejamento e
organização. Uma das coisas mais frequentes nas nossas cidades são obras
que se repetem praticamente para a mesma finalidade sem qualquer
conexão e visão sistêmica.
Poderíamos apresentar um grande número de situações que serviriam de
exemplos da nossa falta de planejamento e organização, entretanto vamos
apresentar apenas três para ilustração:
•A questão do transporte de cargas no país – a nossa visão
imediatista nos conduziu ao transporte prioritariamente rodoviário. É
claro que em um sistema planejado, para um país com as dimensões do
nosso certamente este não seria o mais adequado. O correto seria uma
ação integrada das modalidades hidroviária, ferroviária e a rodoviária
como complemento e jamais como a principal como temos hoje. O resultado
de tudo isto são estradas congestionadas, problemas no cumprimento de
prazos e aumento de custo dos produtos em face de um transporte mais
caro.
•O transporte de massa nas nossas grandes cidades-tem se dado sempre
prioridade até hoje ao transporte na superfície por meio de ônibus,
qualquer ação de planejamento conduziria a esta alternativa como
complementar, nunca a principal como se vê hoje em todas as cidades
brasileiras.
•Organização tributária – os tributos no Brasil nos três níveis de
governo demonstram alto nível de desorganização e de improvisação, um
cipoal de leis, decretos, circulares, etc. que tornam o contribuinte
atônito e o controle da arrecadação extremamente complicado.
Certa vez presenciei uma discussão, por que estrangeiros de países
mais organizados adoram o nosso país. A conclusão foi assim bem simples,
o interesse estrangeiro pelo nosso país decorre é claro, em sermos um
país tropical, de grandes belezas naturais, termos um povo hospitaleiro e
bonito e ainda uma nação sem conflitos ameaçadores à segurança
individual e coletiva. Logicamente considerando os aspectos citados e
ainda vivenciarem de passagem este descompromisso com tudo deve ser
interessante, talvez não o seja para quem vive aqui neste caos e nesta
desordem quase total.
Por: Laerce de Paula Nunes é engenheiro metalurgista pela UFF, com curso de Engenharia de Equipamentos pela PETROBRAS, onde trabalhou durante 25 anos. Autor dos livros “Pintura industrial”, “Proteção catódica”, “Materiais: Aplicações de Engenharia, Seleção e Integridade” e “O Brasil e a visão de futuro – A miopia de uma nação”.
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